quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Sul do Sudão, o caçula problematico

A midia brasileira não costuma se interessar muito pela Africa. Enquanto aqui na França a Tunisia vem ocupando o lugar de maior destaque na seção internacional nas ultimas semanas, nos jornais brasileiros sai uma notinha ali, outra la. Sim, temos que levar em consideração o passado colonial entre a França e o continente africano e o fato de muitas destas nações falarem francês, mas poxa, a Africa não deveria ser desprezada assim por nos. E se até a Tunisia foi esquecida, que dira o Sudão.

O Sul do Sudão acabou de votar um referendo popular pela sua independência do Norte do Sudão e deve se tornar em breve o 52° pais africano - quase 99% dos votantes optaram pela separação. Mas os problemas da região estão muito longe de chegar ao fim. O Sudão, como a gente conhece hoje, teve uma historia dificil, conquistou sua independência apenas em 1956 e passou quase esse tempo todo em guerra civil. A primeira delas aconteceu na independência e durou até 72. A segunda começou em 1983 e terminou em 2005. Como quase todas as nações africanas, seu territorio foi demarcado por acordos politicos, não por fronteiras naturais que separaram uma cultura da outra ao longo dos séculos. Podem perceber que o mapa da Africa é todo quadradinho, sinal que tem alguma coisa errada. No Sudão, o norte é ocupado por arabes muçulmanos e o sul, por africanos cristãos. A paz entre os dois grupos so veio em 2005 com a assinatura de um acordo que dava ao sul o status de região autônoma. A capital Cartum fica no norte, mas o sul abriga importantes reservas de petroleo.

O Norte do Sudão inclui Darfur

O problema é que o Sul do Sudão ainda nem nasceu e ja esta condenado. Assim que for oficializado, o novo pais entrara automaticamente em ultima posição em todas as classificações internacionais: 90% da população vive com menos de um dolar por dia; a mortalidade infantil atinge 10% das crianças de até 5 anos; a mortalidade no parto é mais elevada do mundo; quase toda a população é analfabeta; a metade dos funcionarios publicos (eles são 300 mil! graças ao clientelismo) nunca frequentou a escola primaria. Em 2005 havia apenas três cirurgiões no Sul do Sudão. O potencial agricola do pais é totalmente inexplorado e todo tipo de alimento (e todo o resto) é importado.

Na verdade, a comunidade internacional é quem sustenta o Sul do Sudão - 85% dos serviços de educação e saude são fornecidos por estrangeiros. Mas a desorganização é tanta, que o pais não consegue investir todo o dinheiro disponivel e acaba perdendo a vez. O Banco mundial ofereceu 500 milhões de dolares, mas a falta de uma estrutura capaz de absorver e investir esse dinheiro, fez com que apenas metade do investimento fosse utilizado. Os organismos internacionais não sabem nem por onde começar, ja que tudo pode ser considerado emergência.

Eh nesse contexto de calamidade que a população votou unânime pela independência do Sul do Sudão. Mas os especialistas ja estão preocupados, prevendo uma guerra civil interna. Se antes o inimigo era representado pelo norte, agora não terão mais quem culpar diretamente e começarão a disputar entre si. O geopolitologo francês Marc Lavergne explicou nesse artigo que existem ainda outros obstaculos para o nascimento do novo pais, entre eles a dificil demarcação de fronteiras, as tribos nômades que circulam entre norte e sul dependendo da época do ano (eles são 11 milhões, quase um quarto da população), a grande quantidade de sul-sudaneses que moram no norte e que se tornarão estrangeiros, a incapacidade do Sul de extrair seu petroleo, a partilha da enorme divida externa do Sudão.

Espero que nos proximos dias a gente ouça falar mais do Sudão.

10 comentários:

Aline Mariane disse...

Loic esteva lá no final do ano. Pra ele, que trabalha em Khartoum, outro problema é que o norte ameaça implantar a charia quando separado. Se já não existe muita liberdade nesse país (as mulheres são proibidas mesmo de usar calça!), ficaria ainda pior.
Otimo texto!! Eh realmente uma pena que no Brasil a gente fale tão pouco da Africa...
Bjss!!

Rita disse...

Amanda, comentei hoje com o maridex sobre os números que você citou aqui e ficamos pensando na desigualdade absurda desse mundo. É enlouquecedor.

Ótimo texto.

Bj
Rita

Anônimo disse...

È impressionante a situação das ex-colonias francesas de origem afro.
Viviane Santana

Renata Inforzato disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Renata Inforzato disse...

iviane,

É impressionante a situação da África toda, seja ela de colonização francesa, inglesa, portuguesa....
Os problemas são tantos, é difícil encontrar a ponta pra desmanchar esse novelo...

O meu medo é que além de todos os problemas já existentes, por trás de todas essas revoluções, grupos radicais islâmicos aproveitem a oportunidade para chegar ao poder e implantar um regime aos moldes do taleban...Antes da revolução islâmica era assim no Irã: um governo corrupto e uma população extremamente pobre, explorada e insatisfeita


Amanda

Moro perto do Bois, mas pro lado de NOgent sur Marne...Daqui até o Chateau de Vincennes são uns 10 minutos de ônibus. Vamos marcar um café sim....Meu email é reinforzato@gmail.com

Ana Duarte disse...

Amanda,

Comprovo o que você disse que aqui no Brasil não falam da África. Estou aqui há mais de uma semana ( volta definitiva) e só ouvi falar uma vez do Sudão, e isso graças a tv Cultura.

Obrigada por postar isso no seu blog,assim me mantenho informada enquanto não assino uma tv de qualidade. af
beijos

Amanda disse...

Gente, so uma coisinha: o Sudão é colônia inglesa.

Renata, vou te mandar um email!

Ana, voltou de vez, é? Ai, como esta sendo? Eu morro de medo da volta...

Eduardo Marques disse...

A imprensa brasileira não mostra a África talvez por causa da nossa falta de vocação para país central no mundo. Só queremos saber das notícias dos "patrões". Triste realidade, mas realidade.

Renata Inforzato disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Renata Inforzato disse...
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