Ao contrario do que pode parecer à primeira vista, La carte et le territoire (em português "o mapa e o territorio") nao é sobre geografia - longe disso. A obra conta a historia da vida de um artista bem sucedido, que começa sua carreira como fotografo e a termina como pintor. Esse livro rendeu a Michel Houellebecq o Goncourt, maior prêmio de literatura francesa. Parece que ele ja era um dos favoritos ha bastante tempo, mas nunca levava. Imagino que os outros livros dele sejam melhores, porque esse, na minha singela opiniao, nao vale o prêmio. Eh bem escrito, facil de ler, mas simples demais, sem emoçoes. Mas até entendo porque os franceses gostaram da obra: ela foi feita apenas para eles. Tem muitissimas referências a apresentadores de TV, artistas, personalidades conhecidas apenas no universo francês. Eu, morando aqui ha quase cinco anos consegui reconhecer apenas a metade das pessoas a quem ele fazia referências.
Outra coisa que me incomodou foi o machismo evidente que o autor carrega consigo. Toda vez que o gênero feminino aparecia na historia, era de forma grotesta com direito a todos os clichês sexistas disponiveis no mercado. A mulher precisa ser bela antes de tudo, tanto que aquela que conquista o coraçao do personagem principal é caracterizada como uma das cinco mulheres mais bonitas da França naquele momento. Ja a relaçoes publicas do artista, a responsavel pelo lançamento, tida como feia mas super competente, é tratada de forma grosseira e irônica. Quando ela passa a cuidar mais da aparência, sobe imediatamente no conceito do autor.
A historia em si nao é nada demais. Jed Martin alcança a fama quando realiza uma série de fotografias de trechos de mapas rodoviarios da Michelin, o que me parece uma tremenda forçaçao de barra. Mas tudo bem, às vezes a arte moderna é imprevisivel. Como pintor, um de seus quadros mais famosos é o retrato de Bill Gates e Steve Jobs conversando, vendido por um valor milionario. Também acho um pouco surrealista demais. O mais interessante no livro, e o que eu acho que conquistou a critica, é que Houellebecq aparece como personagem secundario importante, convidado por Jed para escrever um texto do seu catalogo de exposiçao. O autor se descreve de maneira nada virtuosa, mas quando fala de seus textos e livros nao consegue esconder certo orgulho e auto-admiraçao. Antes de ler o livro, tudo o que eu sabia dele era que Houellebecq é assassinado de forma brutal. Inclusive eu levei um baita susto ao ouvir um reporter na TV dizer assim: "Eh com grande pesar que anuncio que o escritor Michel Houellebecq, ganhador do prêmio Goncourt, foi assassinado em sua casa na manha desta terça-feira". Pulei da cadeira, imaginei o escândalo no mundo das letras francês! Inveja, rivalidade, assassinato! Mas logo depois me dei conta que essa foi a forma original que o jornalista encontrou pra falar sobre o livro. Fail total.
Houellebecq tenta ainda fazer umas previsoes completamente sem-noçao do futuro. Gente, em que mundo esse homem vive? Dizer que em 2030 a França sera um pais "essencialmente agricola", sem que nenhuma catastrofe sem precedentes aconteça, é ignorar completamente a sociedade na qual se vive. So por essa previsao sem cabimento eu ja arrancava o prêmio das maos dele.
Enfim, o que pude notar no livro é que Houellebecq é uma pessoa depressiva, sarcastica, pessimista, mal-humorada, machista, ou seja, tudo o que um escritor precisava ser em algum século passado. Sorte a nossa que os tempos sao outros.