terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Quiche Lorraine à la Amanda


Cozinhar nunca foi meu forte. Mas confesso que nesse ultimo ano andei pegando mais gosto pela coisa. Em parte porque estive mais presente na cozinha, ja que tinha mais tempo livre que o cheri, que é quem normalmente prepara as refeições, mas acho injusto quem chegar cansado do trabalho ter que cozinhar se o outro esta em casa. Parceria é a palavra-chave. Então me munia do livrinho de cozinha que ganhamos no natal passado dos nossos amigos queridos e tentava fazer coisinhas diferentes. Andei numa fase de tentar eliminar ao maximo coisas prontas, tipo molho de tomate, conservas, massas congeladas, mas o problema é que o paladar acostumou com tudo fresquinho e agora faço careta toda vez que precisamos recorrer aos industrializados, o que não é nada raro. Talvez quem não more na França não saiba, mas aqui tem tudo pronto. A verdade é que estou gostando de experimentar pôr a mão na massa e hoje publico no post algo que nunca pensei que fosse escrever: uma receita.

Que fique claro que eu sou iniciante, então nada de muito sofisticado. O lado bom é que se eu fui capaz de fazer, qualquer um é também, então podem se jogar sem medo. A receita escolhida foi a de quiche, tradicional prato francês.

Quiche Lorraine

Massa (pâte brisée):
* 125g de manteiga (nem vem com esse papo de margarina)
* 250g de farinha
* Sal à gosto

Recheio:
* 4 ovos
* 300ml de leite (para uma quiche mais "rica", usar creme de leite)
* 150g de presunto picado (o original leva bacon defumado, como não gosto, adaptei)
* Sal e pimenta à gosto

Começar pela massa. Picar a manteiga fria em cima da farinha e do sal e ir amassando com os dedos até obter uma farofa assim:


Acrescentar um pouco de agua, no maximo meio copo, misturar com uma faca (é importante não manusear muito a massa com a mão):


Forme uma bola com as mãos, enrole naquele plastico de cozinha e deixe pelo menos uma hora na geladeira, onde se conservara por até dois dias.


Abra a massa com um rolo (vale a pena investir um euro - foi o que eu paguei - e se livrar dos copos e garrafas que so atrapalham sua vida). Forre um tabuleiro médio ou varias forminhas individuais, fure o fundo com um garfo e deixe esperando na geladeira. Coloque o presunto no fundo da massa (se for bacon tem que fritar antes). Uma boa variação é colocar alho poro ja cozido também, fica uma delicia! Misture os ovos, o leite, o sal e a pimenta e jogue a mistura sobre o presunto. Deixe no forno por cerca de 40 minutos, até que doure em cima.

Oh céus! Minha tortinha veio com defeito! Desculpa ai, tava tão faminta que esqueci de tirar a foto antes de comer. Essa tortinha foi a sobra da grandona ai de baixo.

domingo, 12 de dezembro de 2010

A justiça policial e um ministro sem noção

Tenho impressão que a policia é a instituição mais corrompida da França. Não é à toa que é uma das profissões mais detestadas pelos franceses. Todo mundo sabe que existe bons e maus policiais, mas a ideia geral é que eles são brutos, arrogantes, violentos e se aproveitam da posição de superioridade em relação ao cidadão comum. Por aqui, ter um policial na familia esta longe de ser um orgulho para os parentes. Enfim, não é uma profissão respeitada e o senso comum tem uma péssima impressão dessa classe profissional. A policia francesa ja foi condenada pela Anistia Internacional por maus-tratos, racismo, uso excessivo da força e pela impunidade para os policiais infratores.

Dai que a justiça francesa resolveu mostrar um pouco de dignidade e condenou sete policiais por falsas acusações contra um homem. Em setembro, um policial foi ferido na perna, atropelado depois de uma perseguição. Ele e seus colegas fizeram um pacto verbal para acusar o homem que perseguiam, mas a verdade é que foi uma viatura policial que causou o acidente. O homem em questão foi acusado de tentativa de homicidio de um policial, crime passivel à perpetuidade. Ao longo do processo, contradições entre os envolvidos começaram a aparecer e eles acabaram confessando a farsa. Na ultima sexta-feira, foram condenados de seis meses à um ano de prisão. Três deles foram condenados ainda por violência policial durante o interrogatorio do suspeito, que teve que ficar sete dias em casa por causa das agressões sofridas. Como os policiais precisam ter ficha limpa para exercerem sua profissão, os sete serão expulsos da policia.

Até que enfim uma boa noticia, não? Justiça sendo feita, dando o exemplo para outros policiais e limpando a corrupção de dentro da policia. Mas parece que nem todo mundo pensa assim. Primeiro foi uma manifestação de cerca de 200 policiais contra a decisão da justiça, revoltados com a condenação. Depois foi o ministro do interior, Brice Hortefeux (famoso por suas posições reacionarias e racistas) que declarou que "nossa sociedade não deve confundir o alvo: é contra os delinquentes e os criminosos que temos que lutar". Sim, monsieur Hortefeux, que tal começarmos pelos policiais corruptos?

Achei que eu estava perdendo alguma coisa, que não estava entendendo a historia inteira, tamanho o absurdo de suas declarações. Como condenar a justiça por ter feito enfim seu trabalho? Acho que essa historia ainda vai dar o que falar, mas espero que a justiça siga firme. A policia finalmente esta se sentindo vulneravel face à justiça e uma reviravolta daria aos policiais a certeza absoluta que estão acima da lei. Ja esta mais do que na hora de acabar com a tirania policial na França.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O vizinho musico

No Rio eu morava num prédio pequeno, onde todo mundo se conhecia e onde moravam essencialmente velhos. Uma vez peguei elevador com um cara jovem que nunca tinha visto antes e imediatamente fui com a cara dele. Batemos papo rapidinho e ele disse que tinha acabado de se mudar. Muito simpatico, sorridente, sotaque nordestino arrastado - sabe quando a gente reconhece alguém "dos nossos"? Pois ele era dos meus. Não perdi tempo e chamei logo ele pra ir tomar um café la em casa. Cinco minutos depois estavamos no meu apartamento. Eu perguntei o que ele estava fazendo no Rio e ele respondeu que era musico e estava gravando um CD. Dai ele contou que no Recife fazia parte de um grupo, a Orchestra Santa Massa e... Meu queixo caiu.

Pausa para explicação. No meu primeiro semestre da faculdade era muito amiga de um menino que trabalhava (e trabalha ainda) na Globo. Estava na casa dele quando ele me mostrou um CD que achou no trabalho e disse que tinha certeza que eu ia amar aquele grupo, que era a minha cara. Foi amor à primeira escutada. Pedi pra levar pra fazer uma copia pra mim e ele respondeu que tudo bem, mas que eu tinha que devolver o mais rapido possivel porque não era dele. Não tenho o menor orgulho em dizer que o tal CD esta na minha estante em Paris. Não sou mais assim, gente, juro. Podem me emprestar as coisas sem medo, viu? Mals, Rico, quando voltar eu te devolvo, ta? Pois o tal CD era "Orchestra Santa Massa e DJ Dolores".


Apaixonei, mostrei pra todos os meus amigos e viciei todos eles. Não faziamos uma festinha que não tocasse Santa Massa. Nossos amigos DJs incorporaram ao seus repertorios e todo mundo perguntava que CD era aquele, pois no Rio eles não eram conhecidos, e a gente se apressava em apresentar o grupo. Viviamos muito satisfeitos com nossa trilha sonora.

Por isso, vocês não podem imaginar o tamanho do meu choque ao ouvir que meu novo vizinho fazia parte da minha banda preferida. Minha vontade era de gritar histericamente e chamar todos os meus amigos la pra casa, mas fingi que era uma pessoa equilibrada. Me apressei em pegar o tal do CD e peguntar "essa Santa Massa aqui???". Sim, era ele, o percussionista, que também ficou surpreso e feliz por sua vizinha ter seu CD até então não muito conhecido. Olha, foi uma época muito boa ter o Jam como vizinho e amigo. Passamos um bocado de tempo juntos, quando não tinha nada pra fazer ia ver se ele não estava em casa. Minha melhor amiga também morava no prédio nessa época (porque nossas mães são melhores amigas), então a gente fazia a festa, era muito bom.

Mas um ano depois, mais ou menos, eu fui pra Australia e quando voltei Jam ja tinha levantado voo. Sempre falava com ele e ouvia "estou gravando com fulana", "agora estou gravando com sicrano". Comecei a ver seu nome no jornal, seu rosto na TV, sua musica no radio. Mudei pra Paris e daqui acompanho sua evolução. Nos encontramos esse ano numa de suas viagens à trabalho e adorei poder dar um abraço bem apertado nesse vizinho!

Então pessoal do Rio, quem estiver a fim de ouvir musica boa, Jam da Silva toca no Rival amanhã.

(e nem vou contar a historia da amiga francesa que o Jam me apresentou e que eu roubei pra mim mas acabei perdendo o contato, e que eu encontrei por acaso em Paris, casada com esse chéri aqui, que eu ja conhecia sem saber desse 'detalhe'. Que alias, é o melhor amigo dessa querida aqui. Adoro esse mundo minisculo!).

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Into the Wild - Uma critica, mas não exatamente ao filme

Nunca soube explicar porque não gosto muito do filme Into the Wild. As pessoas chegam pra mim, empolgadas, dizendo o quanto a-mam! o filme, o quanto o cara é excepcional, o quanto elas admiram quem tem uma coragem dessas. E eu fico la, com cara de quem comeu e não gostou.

Acho o filme em si meio bobinho, meio ingênuo, meio pretensioso, enfim, nada demais. Mas alguma coisa me incomodava nele e eu não sabia o que era. Então me dei conta que não é o filme que me incomoda, mas a interpretação que algumas pessoas fazem dele, como se aquela fosse a unica saida possivel do sistema. Elas admitem que o protagonista toma decisões sabias e nobres, mas decisões que elas proprias não poderiam tomar, então se confortam com a ideia de não fazer nada pra mudar e continuar vivendo suas vidas insatisfeitas. Ora, você não precisa doar todas as suas economias nem queimar o resto do seu dinheiro para mudar de vida. Você não precisa sair por ai caçando javalis para deixar de ser consumista. Você não precisa ser tão radical assim para encontrar a verdadeira felicidade. Acho que esse filme acaba sendo um conforto do tipo "viu, eu não tenho coragem de fazer o mesmo, então o melhor que tenho a fazer é continuar aqui onde estou". Não é oito ou oitenta, sabe.

Parece a mesma desculpa que ouço de gente que quer fazer grandes viagens mas não pode porque não tem dinheiro. Poxa, eu viajei três meses no sul da América do Sul e gastei pouco mais de mil reais! E olha que Brasil, Chile e Argentina são os paises mais caros do continente. Não peguei avião, andei 150 horas de ônibus (contadas), acampei, troquei alimentação por trabalho, fiz cocô no mato, não comprei lembrancinha nenhuma, mas foi uma experiência incrivel que vou me lembrar pro resto da vida. Mochilão não precisa ser na Europa, sabe. E pode ser com os filhos também, viu?

Outro exemplo são pessoas incomodadas com o estilo de vida mais leve de outras. Elas fazem pressão, soltam ironias do tipo "e ai, não ta na hora de arranjar um emprego?" e se sentem aliviadas quando suas vitimas finalmente cedem e entram no sistema como cordeirinhos. O interessante é que notei que as pessoas que vi fazendo esse joguinho ja demonstraram vontade de mudar de vida, de largar tudo e tentar outra coisa. Parece que elas precisam ter certeza de que outro caminho não era/é possivel. Porque se elas, que queriam tanto levar uma vida diferente, cairam no sistema, é porque uma via alternativa era utopia. Ver alguém conseguir ter uma vida com a qual elas sonharam seria duro demais. Então sorriem de satisfação quando outra pobre alma é obrigada a arranjar um trabalho que detesta e ficar la até o resto de sua vida. Então elas suspiram aliviadas e soltam um conformado "é assim que as coisas são".

#spoiler:

E se alguém por acaso ousar conseguir sair do sistema, é melhor que ele morra no final do filme. Assim a gente pode dormir tranquilo.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

E se nos mostrassem o que não queremos ver?

Ontem à noite estava vendo um filme sobre a segunda guerra mundial e torci o nariz quando a câmera deu close em dois corpos mutilados jogados num canto. Eu sempre achei que mostrar cenas morbidas, de cadaveres dilacerados e tal era de extremo mal gosto e servia apenas para o prazer bizarro que certas pessoas têm de ver essas coisas. Tipo aquele video Faces da Morte, sabe? Que mostra gente morrendo na frente das câmeras. Sempre fugi dessas coisas e não entendo como ha publico para esse tipo de espetaculo. Eu sentia o mesmo em relação ao jornalismo. Trabalhei no jornal da TV Brasil (quando ainda era TVE) e parte do meu trabalho era olhar as imagens que recebiamos da Reuters. Ficava irritada com a quantidade de corpos em estado inimaginaveis, mesmo de crianças, que apareciam na minha frente. Achava que os jornalistas não deveriam nunca expôr essas imagens.

Mas...

Ha uns três anos li o livro do jornalista inglês Robert Fisk, A Grande Guerra pela Civilização. Para mim, Fisk é a referência sobre cobertura de guerra, o cara é brilhante. Ele trabalha no The Independent (que ja respeito pela sua posição independente), mora no Libano e cobriu diversos conflitos no Oriente Médio. Dai que ele defende a publicação de fotos e videos barbaros, com corpos dilacerados, com crianças mortas, com braços espalhados pelo chão. Justamente para mostrar que a guerra não se resume aos numeros, às estatisticas, às estratégias. Ele viu coisas tão terriveis que acha que se todos vissem o que ele viu, o mundo seria pacifista. A verdade é que ouvir "treze pessoas morreram e trinta ficaram feridas" entra por um ouvido e sai pelo outro, mas ver as treze pessoas mortas e as trinta feridas nos jogaria na cara a barbarie que esta acontecendo logo ali, enquanto estamos sentados confortavelmente em nossos sofas. Porque a guerra é muito diferente do que acontece nos filmes. Quando um cara é atingido, raramente acontece como na TV que a bala entra no peito, mancha um pouco a camisa e tchum, ele morre. A realidade é bem mais feia que isso e a guerra de verdade é inimaginavel pra mim ou pra você.

Quem sabe se formos confrontados com a realidade, não nos comovemos mais, não vemos mais claramente o absurdo da coisa e fazemos uma maior pressão para o fim dessas guerras. Se o Bush fosse obrigado a ver cada um dos corpos dos inocentes que ele matou, quem sabe ele não tomaria decisões mais sabias no Iraque? Porque é muito facil continuar quando se tira toda a humanidade do conflito, quando a morte de crianças se torna "efeito colateral", quando a dor se converte em estatisticas e quando o sofrimento se transforma em numeros.

Continuo dividida. Ao mesmo tempo que acho os argumentos dele muito validos, não gostaria de dar de cara com fotos chocantes cada vez que abrisse os jornais. Sera que precisamos mesmo de um estimulo visual para termos mais empatia com os povos que sofrem?

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Duas indicações culturais

Fico surpresa quantas pessoas entram no blog procurando por quadrinhos franceses. Parece que muita gente anda ligada nos BDs daqui, seja porque tem paixão por quadrinhos, seja porque quer aprender francês e essa é uma excelente forma de treinar. So tem um problema: recebo varios emails perguntando onde encontrar HQs francesas no Brasil e eu nunca sei responder. Mas o Lucas, um leitor fã de quadrinhos, me deu a dica da Livraria Francesa, que não tem quase nenhuma das minhas indicações, mas tem muitos outros. Quem souber de outros lugares que vendem HQs ou livros em francês no Brasil, por favor deixe aqui sua dica!

Outra indicação bacana veio da Helena. Ela descobriu um site que disponibiliza audio livros gratuitos em francês. Assim, quando estivermos no metrô, no ônibus, ou até dirigindo podemos nos dar ao luxo de ouvir os classicos, sem forçar ainda mais os olhos ja cansados de tanto computador o dia todo. Ta valendo também para aqueles que querem exercitar o francês. Eu vou começar pelo Le journal d'une femme de chambre, de Octave Mirbeau, que é o audo livro mais bem votado do site. Comecei a ouvir e achei a voz da mulher bem clara e ela ainda acrescenta sons externos de acordo com a narrativa. Parece uma boa ideia, se vocês aderirem, voltem para dar sua opinião.
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