quinta-feira, 28 de maio de 2009

Burocracia, versão brasileira

Aproveitando o gancho do ultimo post sobre o departamento de imigração na França, nesse eu vou contar a nossa experiência com a imigração no Brasil. Os dois funcionam muito mal, mas para mim existe uma grande diferença. Enquando na França eles são grossos e antipaticos, no Brasil eles são incompetentes.

Para quem não sabe, conheci o cheri na Australia. Viajamos e trabalhamos juntos por la uns 8, 9 meses e como o amor é lindo, decidimos que ele iria pro Brasil. Assim que chegamos no Rio fomos na Policia Federal, para ver o que tinhamos que fazer. Mostramos os documentos dele, e o cara explicou que ele tinha um visto de 3 meses, renovaveis por mais 3 meses e depois teria que passar 6 meses fora do pais e assim por diante. E então começamos a correria pra saber como ele poderia ficar mais tempo legalmente. Fomos umas 10 vezes na PF e numa delas olharam os papéis dele de novo e soltaram : você esta ilegal no pais ha um mês e meio.

Como assim? Acontece que no aeroporto eles deram um visto de somente 10 dias, e não de 90 como de praxe. So que não avisaram NADA pra ele e o documento estava completamente ilegivel, não tinha nem a data de entrada marcada no passaporte, porque o carimbo falhou. So tinha um rabisco num papelzinho miseravel que eles dão pros turistas, que poderia muito bem ser uma assinatura, mas que era um fatidico 10. E agora, moço? Agora ele tem que pagar uma multa de 8 reais por dia (alguem tinha alguma duvida?) e vai ter que sair do pais e voltar, pra se regularizar.

Não adiantaram protestos, não adiantou dizermos que tinhamos ido na PF antes e todo mundo disse que estava tudo em ordem, não adiantaram os amigos dos amigos dos amigos. Nada. Resultado, cheri pegou um ônibus (porque cheri é pobre) pra Argentina num dia e voltou no outro, pois tinha que dar aulas de francês no curso. 60 horas de ônibus de uma vez. Ah, mas o melhor esta por vir! Na fronteira o ônibus simplesmente passou imigração brasileira e so parou na Argentina, dai ele ganhou o carimbo de entrada, sem ganhar o de saida, que era justamente o que precisava. Foi se informar e o motorista disse que como ele ia adivinhar que tinha que parar, ora bolas? Cheri pegou um outro ônibus de volta e quando chegou la não tinha ninguém no posto. Dai viu la longe umas pessoas e foi atras. Eram os guardinhas da imigração caçando passarinhos com as armas da PF. "O que você quer?", "Um carimbo", "De entrada ou saida?", "Os dois". Foi assim que cheri ganhou os dois carimbos ao mesmo tempo, foi curtir um pouco as cataratas e voltou para o Rio duas horas depois.

Mais tarde, viajando pelo Chile e Argentina, encontramos varios estrangeiros que passaram a fronteira de ônibus e tiveram o mesmo problema de falta de carimbo. Fora na PF do Rio, que eu sempre servia de tradutora entre os estrangeiros perdidos, que é claro que não falavam português e os funcionarios incompetentes, que é claro que não falavam inglês.

Et voila! Sem falar na decisão entre casar ou separar de vez que tivemos que tomar menos de um ano depois de nos conhecermos, pois ficar so namorando e se conhecer melhor simplesmente não era uma opção para a imigracao do Brasil, muito menos para a da França. Se normalmente os obstaculos de um relacionamento são as brigas, os ciumes, as diferenças de opiniões, para nos foram sem duvida os departamentos de imigrações.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

A burocracia não entende de relacionamentos

Uma vez por ano sou obrigada a fazer a coisa que mais detesto na França: renovar meu visto. Se tem um lugar onde o mito do francês antipatico é verdade, é na prefeitura de policia. Tenho que voltar nesse lugar sombrio dia 16 de junho e ja estou tendo calafrios. Ano passado eles negaram a renovação. Disseram que não havia provas suficientes de que estavamos casados de verdade. Certidão de casamento, livre de famille, conta conjunta, endereço conjunto, pombas, o que mais vocês querem?! Eles pediram um saldo da nossa conta corrente, o que normalmente é ilegal. Voltamos três meses depois, porque é logico que não da pra marcar pra semana seguinte, e a mulher continuou encrencando, até que não achou mais nenhuma desculpa e foi obrigada me dar o visto.

Não entendo a postura dos funcionarios, eles te olham como se estivessem fazendo um favor. Como se voce estivesse ali pra estragar o dia deles, mas eles, como são muito bonzinhos, vão perder o precioso tempo deles e analisar o seu caso e quem sabe, dependendo do humor deles, a gloria suprema, te presentear com um visto. Alguém avisa pra eles, que eu não queria porcaria de visto nenhum não, que eu não queria nem casar, mas que eles me obrigaram. Uma coisa é certa, a burocracia não entende nada de relacionamentos. Alguém diz pra eles que eu não quero essa titica de nacionalidade francesa, eu so quero poder ir e vir sem problemas e para isso eu preciso de um documento, porque foi assim que eles decidiram que ia ser. Se foram eles que fizeram as regras, que pelo menos cumpram-as com dignidade.

Tudo indica que esse ano não vai ser muito melhor. Ja comecei mal quando liguei pra marcar a entrevista :

- Alô, estou ligando para marcar a renovação do meu visto.
- Numero da carte de sejour.
- Tal tal tal.
- Quanto tempo de casada ?
- Três anos.
- Qual o dia do casamento ?
- O dia do casamento…?

(ao fundo): cheri qual o dia do casamento? Ih, perai, deixa eu pensar. Pega a certidão !

- Pera so um minutinho, moça.
- …
- Achei, é dia tal (claro que ja esqueci de novo).

Ora, eles ja me obrigaram a casar, querem que eu decore a data também?

Não estou bem certa se causei uma boa impressão.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Top 10: expressões francesas

10- Shepa (pronuncia-se 'chepá')
Algo do tio: eu não sei
Shepa é a forma coloquial de dizer je ne sais pas, 'não sei' em português. Eu sempre ficava na duvida entre falar um ou outro e acabava saindo um cepá, que não quer dizer muita coisa, só entregava de vez o meu embaraço com o francês. Essa palavra é da mesma categoria do chuí, que é o diminutivo de je suis (eu sou/estou). Esse é o tipo de expressão que te ferra quando você sai de um curso de francês, onde aprende toda a linguagem formal (para não dizer artificial) e todas as conjugações de verbos, mas que quando encara a vida de verdade se sente super frustrado por não conseguir entender uma palavra do que as pessoas falam, nem as coisas mais simples.

9- Bon courage (pronuncia-se 'boncurraj')Algo do tipo: boa sorte
Ela nao gosta dessa palavra. Bon courage é uma expressão de compaixão, onde a pessoa mostra solidariedade, mas não vai te ajudar (ou porque não pode ou porque não quer mesmo). É um apoio moral. Quando fomos ao Brasil pela ultima vez, meu namorado perguntou se podia dizer ‘coragem’ à caixa do supermercado na hora de ir embora, coisa que ele faz na França. Imagina, acho que a pessoa ia se sentir ofendida e pensar, poxa, meu trabalho é tão ruim que estão tentando me consolar. Atenção, não estamos falando de boa sorte, que é bonne chance. Seu amigo tem que estudar pra uma prova? Bon courage. Ele vai fazer a prova agora? Bonne chance!

8- Franchement (pronuncia-se 'frranchman')Algo do tipo: francamente, sinceramente
Quando não falava francês e ouvia as pessoas conversando na rua, sempre ouvia um tal de French-man e pensava quem era o tal francês que eles estavam falando. Isso porque lingua estrangeira para mim era sinônimo de inglês, então inconscientemente eu procurava algum significado na lingua que eu conhecia). Franchement, acho que francês é bem mais dificil de aprender que inglês.

7- Pas mal (pronuncia-se 'pá mal')Algo do tipo: legal. Ao pé da letra: não é tão ruim
As vezes os franceses são pessoas contidas. Em vez de dizerem muito bom!, excelente!, magnifico!, eles dizem simplesmente, pas mal. Eu até me ofendia, me esforçava pra fazer uma coisa e no final, pas mal. O bolo que você fez? Pas mal. O presente que você me deu ? Pal mal du tout! (variação super empolgada do pas mal). Poxa vida, vamos ousar um pouquinho, meu povo!

6- ça va aller (pronuncia-se 'sa va alê')Algo do tipo: vai ficar tudo bem
Essa é uma expressão de consolo quando alguém esta numa situação dificil ou quando dita pela propria vitima, quer dizer que ela não esta bem no momento, mas vai ficar. Uma vez, quando eu estava tomando conta de um bebê de 1 ano e meio e da sua irmã de 6, o bebê se aproximou dramatico dizendo, dodoi, dodoi. A irmã, depois de examinar o braço dele, sentenciou: não Sacha, isso não é um dodoi, é so uma meleca! E completou irônica, ça va aller! Outra vez eu estava correndo no parque quando vi um cara se estabacar no chão. Perguntei se tava tudo bem, ele respondeu sem graça, ça va aller.

5- Quoi (pronuncia-se 'quá')
Algo do tipo: desconhecido
A giria das girias. Ela é um daqueles vicios de linguagem, que não têm nenhuma função util na frase, esta ali apenas para enfeitar. Podemos excaixa-la praticamente no fim de qualquer frase, mas dê preferência para aquelas onde você se mostra um pouco mais revoltado ou quer mostrar seu ponto de vista. Essa palavra é completamente dispensavel, quoi.

4- Coucou (pronuncia-se 'cu-cu')
Algo do tipo: oie!
Esse eu uso muito com as criancas. Toda vez que um boneco faz uma aparição repentina, ele tem que dizer coucou! Mas não é so para crianças não, é uma forma carinhosa se dizer oi, em qualquer idade. So não vai chegar pro chefe e dizer, coucou chefe! Não pega muito bem. Sabe aquela brincadeira que todos os adultos fazem com os bebês, de se esconder e de repende aparecer: achou! Pois é, em francês é coucou.

3- Hop-la! (pronuncia-se 'ôplá!')
Algo do tipo: ???
Caracteriza o fim de uma ação. Essa é dificil de explicar porque não temos uma equivalência em português. Sabe aquela ultima cereja que voce põe no bolo, ela fica super bem acompanhada de um hop-la! Na verdade eu nem sei como se escreve, ja que é mais uma expressão oral mesmo. Na minha aula de mestrado, o professor estava dando maus exemplos de apresentações orais (ok, eu sou o melhor deles). Ele disse que tinha um aluno que a cada vez que virava a pagina das anotações, dizia 'hop-la!', acompanhando o movimento. Eu não consegui parar de rir, imaginando a cena.

2- Voila (pronuncia-se 'voalá')Algo do tipo: aqui está, ou pronto
Voila é uma variação mais formal do hop-la! Os franceses dizem o tempo todo. Também serve como um tipo de ‘viu, eu te avisei!’, voila, voce derrubou o copo. Se alguém come muito, você pode dizer (ou de preferência apenas pensar) voila alguém que gosta de comer. Quando você termina de assinar um documento, pode dizer, voila!

1 – Oh-la-la (pronuncia-se uh-la-lá)
Algo do tipo: caraca! (para os cariocas, é claro)
O grande classico francês. Eu achava que era mito, assim como quase tudo que a gente diz da Franca, mas não é não! O uh-la-la esta presente no vocabulario diario dos franceses, principalmente nos jogos de futebol. Nesse caso, como a empolgação é grande, o locutor pode ficar repetindo os 'las' varias vezes, proporcionalmente ao tamanho da jogada. Eu que odeio futebol, assisto so pra ouvir o cara falando uh-la-la-la-la-la-la-la……. Ao contrario do que a gente pensa, essa expressão não é usada tanto para elogios, mas para preocupações. Tipo, oh-la-la, vai chover a semana toda, putain! (Essa ultima palavra fico devendo para um top 10 palavrões, ;)

domingo, 17 de maio de 2009

Ah, esses motoristas parisienses...

Aconteceu logo quando cheguei na França. Peguei um onibus para ir na casa de uma amiga que morava fora de Paris e como estava meio perdida, comecei a prestar bastante atenção no display eletrônico que informa sobre as estações, sobre quanto tempo falta para chegar etc.

"Seja bem-vindo" ... "Chegamos em Mont Rouge dentro de 15 minutos" ... "Tome cuidado com seus pertences" ... "O motorista esta solteiro" ... "Agradecemos a preferência" ...

Perai! Volta la! Como assim 'o motorista esta solteiro'?? Duvidei do meu francês. Fiquei esperando passar de novo, não acreditei quando passou de novo, comecei a olhar pros lados e vi uma amiga cutucando a outra e mostrando a mensagem. Todas as mulheres do ônibus começaram a sorrir, inclusive eu.

Olhares furtivos das moças ao motorista, olha que ele é bem bonitinho! E ainda tem senso de humor. Sera que funcionou?

Paris tem dessas coisas.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Controvérsias

Semana passada algumas mulheres fizeram um protesto em uma piscina publica no centro de Paris a favor da igualdade dos sexos. Elas apareceram todas sem a parte de cima do biquini, dizendo, se eles podem, por que nos não podemos? Se a resposta parece obvia para a maioria das pessoas, é a prova de como o machismo esta enraizado em nossas mentes.

Para mim, essa historia de não poder mostrar o peito parte do mesmo principio daquele que diz que as mulheres devem usar véu ou burca, em certos paises muçulmanos. Eh exatamente a mesma coisa. Eles dizem que os seios das mulheres é um simbolo da sexualidade. Ora, so é um simbolo da sexualidade porque os homens decidiram que seria desse jeito. Assim como os cabelos, o rosto ou até a mulher inteira é um simbolo da sexualidade feminina para certas culturas, então vamos esconde-la rapido, sempre com o argumento de protege-la, é claro.

O mais engraçado é que geralmente as pessoas que dizem detestar as praticas da religião islamica, são os primeiros a condenar a igualdade dos peitos entre homens e mulheres. Eles dizem que não tem como comparar, que é diferente. Sim, é diferente porque é sua cultura. Porque a cultura do outro é burra, a sua sim tem logica.

Existem aqueles que não entendem como as proprias mulheres islâmicas aceitam se esconder debaixo de véus, mas imaginem dizer para as nossas mulheres que a partir de hoje elas deveriam ficar sem camisa quando fizessem atividades do dia-a-dia, assim como o homem. Por mais que fosse legal, a grande maioria delas não faria, por estar acostumada de outra forma.

E se você, homem, for contra, que va protestar na piscina usando um sutiã.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Rebequinha

Ela foi a primeira criança que tomei conta quando cheguei à Paris. Arranjei esse emprego na primeira semana, na época me pareceu normal, mas hoje sei que é quase impossivel encontrar um trabalho assim rapido, sem falar francês e quase sem experiência. Rebeca ja chegou me trazendo sorte.

A pequena franco-brasileira de 2 anos tinha acabado de chegar na França, assim como eu, e não entendia uma palavra de francês. Quando falavam com a gente na rua, a gente não entendia, mas não tinha problema, pois entendiamos muito bem uma à outra, e continuavamos nosso caminho sem dar muita bola pros outros.

Ela era a unica pessoa no mundo todo que gostava de me ouvir cantar e eu aproveitava a audiência pra soltar a voz nos classicos coelhinho, minhoca e janelinha, com a devida interpretação dos gestos, é claro.

A gente se divertia juntas. Idas e vindas ao parque cantando como doidas no meio da rua. Faziamos castelos de areia, montavamos quebra-cabeças, assistiamos Pingu, perseguiamos pombos, seu esporte favorito. Ensaiamos nossas primeiras palavras em francês.

Ficamos juntas por três ou quatro meses apenas, depois disso eu nunca mais a vi. Sempre fiquei de ir visita-la, mas sempre acontecia alguma coisa, e depois trabalho, faculdade, a vida vai levando, sabe como é. Dois anos se passaram.

Sempre penso nela.

So que agora, a verdade é que eu tenho medo de ir visita-la e ela não me reconhecer.


sexta-feira, 1 de maio de 2009

O desprazer de escrever

Eu sempre gostei de escrever. Acho que a gente se expressa melhor escrevendo, pois temos tempo de pensar, escolher as palavras, mudar de idéia, e ficar assim até o texto refletir exatamente o que queremos dizer. Dependendo da complexidade do assunto (e da inspiração, é claro), chega a ser um processo doloroso que no fim é recompensado por um orgulho proprio que diz: foi duro, mas valeu a pena.

Mas essa regra não vale para escrever numa lingua estrangeira. Aqui na França, quando tenho que entregar algum trabalho na faculdade, pesquiso, penso, escrevo, escrevo, escrevo e no final, o resultado é uma bosta. Quer dizer, à primeira vista para mim fica bom, mas quando peço pra alguém corrigir vejo que esta tudo errado. Resultado: perdi completamente o prazer de escrever. As vezes bolava frases que, de acordo com minha formação tupiniquim, estavam bem impactantes e ficava bem orgulhosa delas, até o meu namorado perguntar: "O que você quis dizer com essa frase? Ela não tem sentido". FRUSTRANTE. Uma vez ele estava de mal-humor e disse: "eu teria menos trabalho se ao invés de te corrigir, escrevesse tudo eu mesmo". Ele é assim, super romântico quando esta irritado.

Não é uma questão de gramatica, mas de construção de idéias. Acho que eu escrevo em português, mas com palavras em francês. Pelo menos ja sinto uma grande diferença de um ano pra ca, até meus "revisores" ja elogiaram, mas ainda não é suficiente. Alias, tenho varios revisores: meu namorado, minha sogra, alguns amigos e até a avo de um bebê que eu tomava conta, que foi super fofa e se ofereceu mais de uma vez pra fazer o serviço. Não sei o que seria de mim sem eles.

A ma noticia é que tenho que escrever uma dissertação de 150 paginas para o mestrado.
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