segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Gente da Australia - Isabel

Quando cheguei em Brisbane optei por ficar em um backpacker (hostel em australianês) até encontrar uma apartamento. O problema é que eu não conhecia muita gente na cidade e meus colegas do curso de inglês estavam todos hospedados em casa de familia. Então fui numa agência brasileira e a moça me disse que tinham três amigas brasileiras procurando uma quarta pessoa pra dividir um apê. Beleza, conheci duas das meninas, bem bacanas e tal, fechamos tudo na hora. No dia da mudança tinham umas coisas num canto da sala: malas, sacolas, tênis, espada, bola medieval com espinhos... Perai! Espada e bola medieval com espinhos? Como assim? Eu, chocada, peguntei de quem eram aquelas coisas e as meninas riram e responderam "é da Isabel, a outra menina que vai morar com a gente e que você ainda não conheceu. Ela deve estar chegando".

Nem deu tempo de pensar numa fuga rapida, era tarde demais, a Isabel ligou e disse que estava subindo. Imaginei que tipo de pessoa coleciona espadas e bolas de tortura medieval, com certeza alguém no minimo estranho, talvez um pouco mal-humorado, quem sabe até uma pessoa que passa as noites olhando seus roomates dormir e imaginando como usar seus brinquedinhos neles. Isabel abre a porta, Amanda espera pelo pior. Isabel é alta, forte e atlética. Atras dela, seu namorado australiano de dois metros de altura, uma parede. As meninas me apresentam os dois dizendo que são campeões de jiu-jitsu. Ja tô quase pedindo meu dinheiro do aluguel de volta, até que a Isabel abre um sorriso enorme e diz com a voz mais doce que alguém pode ter "Ei, é você a guria que vai morar com a gente? Que massa!". John, o namorado dela, também e super sorridente e gentil.

Ja não tinha a menor duvida de que a Isabel não era como as outras pessoas, mas no melhor sentido da frase. Ela é uma das pessoas mais livres que ja conheci. Parece que os problemas que atingem os seres humanos comuns não conseguem alcança-la. Ela esta sempre feliz, sempre sorridente, sempre de bom-humor, sempre disposta a aventuras. Acho que isso so atrai coisas positivas. Isabel é uma super esportista, fazia judô no Brasil e na Australia descobriu o jiu-jitsu. Gosta de estar ao ar-livre, de fazer trilhas, de andar de bicicleta, de organizar passeios e luaus, de explorar... e se tiver uma caverna escura e sombia no caminho, que festa!

Nos demos super bem os três meses que moramos juntas. Até em passeata contra a guerra do Iraque nos fomos. Depois, ja no Brasil, ela foi pro Rio participar do campeonato mundial de jiu-jitsu e ficou la em casa. E eu por minha vez passei uns dias na casa dela em Floripa. Conhecendo seus pais finalmente entendi porque a Isabel é tão livre. Conheci também o Thiago, um cara muito gente boa e com enorme talento (ou dedicação?) para a musica que agora é marido da Bel. Ver os dois juntos é não ter duvidas que se completam em suas diferenças. Eles também ja vieram aqui pra Paris - adivinha so: ela veio participar do campeonato europeu em Lisboa e deram uma passadinha na França. Ficaram aqui em casa e quando o cheri e eu tivemos que ir pro Brasil no meio da estadia deles, entregamos as chaves em suas mãos sem medo. E se la, naquele dia em Brisbane, se alguém me dissesse que confiaria toda a minha vida parisiense nas mãos da dona daquela bola de ferro espinhenta, eu não acreditaria.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Sul do Sudão, o caçula problematico

A midia brasileira não costuma se interessar muito pela Africa. Enquanto aqui na França a Tunisia vem ocupando o lugar de maior destaque na seção internacional nas ultimas semanas, nos jornais brasileiros sai uma notinha ali, outra la. Sim, temos que levar em consideração o passado colonial entre a França e o continente africano e o fato de muitas destas nações falarem francês, mas poxa, a Africa não deveria ser desprezada assim por nos. E se até a Tunisia foi esquecida, que dira o Sudão.

O Sul do Sudão acabou de votar um referendo popular pela sua independência do Norte do Sudão e deve se tornar em breve o 52° pais africano - quase 99% dos votantes optaram pela separação. Mas os problemas da região estão muito longe de chegar ao fim. O Sudão, como a gente conhece hoje, teve uma historia dificil, conquistou sua independência apenas em 1956 e passou quase esse tempo todo em guerra civil. A primeira delas aconteceu na independência e durou até 72. A segunda começou em 1983 e terminou em 2005. Como quase todas as nações africanas, seu territorio foi demarcado por acordos politicos, não por fronteiras naturais que separaram uma cultura da outra ao longo dos séculos. Podem perceber que o mapa da Africa é todo quadradinho, sinal que tem alguma coisa errada. No Sudão, o norte é ocupado por arabes muçulmanos e o sul, por africanos cristãos. A paz entre os dois grupos so veio em 2005 com a assinatura de um acordo que dava ao sul o status de região autônoma. A capital Cartum fica no norte, mas o sul abriga importantes reservas de petroleo.

O Norte do Sudão inclui Darfur

O problema é que o Sul do Sudão ainda nem nasceu e ja esta condenado. Assim que for oficializado, o novo pais entrara automaticamente em ultima posição em todas as classificações internacionais: 90% da população vive com menos de um dolar por dia; a mortalidade infantil atinge 10% das crianças de até 5 anos; a mortalidade no parto é mais elevada do mundo; quase toda a população é analfabeta; a metade dos funcionarios publicos (eles são 300 mil! graças ao clientelismo) nunca frequentou a escola primaria. Em 2005 havia apenas três cirurgiões no Sul do Sudão. O potencial agricola do pais é totalmente inexplorado e todo tipo de alimento (e todo o resto) é importado.

Na verdade, a comunidade internacional é quem sustenta o Sul do Sudão - 85% dos serviços de educação e saude são fornecidos por estrangeiros. Mas a desorganização é tanta, que o pais não consegue investir todo o dinheiro disponivel e acaba perdendo a vez. O Banco mundial ofereceu 500 milhões de dolares, mas a falta de uma estrutura capaz de absorver e investir esse dinheiro, fez com que apenas metade do investimento fosse utilizado. Os organismos internacionais não sabem nem por onde começar, ja que tudo pode ser considerado emergência.

Eh nesse contexto de calamidade que a população votou unânime pela independência do Sul do Sudão. Mas os especialistas ja estão preocupados, prevendo uma guerra civil interna. Se antes o inimigo era representado pelo norte, agora não terão mais quem culpar diretamente e começarão a disputar entre si. O geopolitologo francês Marc Lavergne explicou nesse artigo que existem ainda outros obstaculos para o nascimento do novo pais, entre eles a dificil demarcação de fronteiras, as tribos nômades que circulam entre norte e sul dependendo da época do ano (eles são 11 milhões, quase um quarto da população), a grande quantidade de sul-sudaneses que moram no norte e que se tornarão estrangeiros, a incapacidade do Sul de extrair seu petroleo, a partilha da enorme divida externa do Sudão.

Espero que nos proximos dias a gente ouça falar mais do Sudão.

domingo, 23 de janeiro de 2011

Ida ao templo budista

Uma das minhas resoluções deste ano é conseguir melhorar minha ansiedade, que esta chegando a niveis insuportaveis. Dai que, convenientemente, ao lado da minha casa tem um centro budista importante, no meio do Bois de Vincennes (sempre vejo os monges dando uma voltinha no parque). Uma vez passei por la e li que eles fazem meditação quase todos os dias às 9h30 da manhã e é gratuito e aberto ao publico. Hum, por que não? Como começo a trabalhar apenas 11h15, la fui eu.


O que dizer da experiência? Resumindo bem, diria apenas que sou uma cética intratavel. Não sei bem o que eu estava esperando, mas não entrei no espirito da coisa. Primeiro que não era so meditação, era sobretudo um grupo de orações e cantorias. Para mim, foi exatamente como assistir uma missa: fiquei muito entediada e não entendia nada do que era falado (tudo era cantado em outra lingua). Todos estavam muito engajados - enquanto eles procuravam seu eu interior, eu pensava "ei, talvez eu possa contar minha vinda ao templo tibetano no blog!". Enquanto eles almejavam o nirvana, eu pensava "que fome. imagina se meu estômago ronca nesse silêncio...". Enfim, um não-pertence total. Abandonei o papel participativo que me cabia e tomei aquele de observadora antropologica. Mais ou menos quando a parte evangélica da minha familia junta todo mundo pra fazer uma oração. A parte catolica adora o entusiasmo e reza mais do que na missa. E fica todo mundo de mãos dadas, de olhos cerrados com força, resmungando amém senhor, acreditando de verdade. E eu la, olhando pra todo mundo, admirando o espetaculo como expectadora, não como protagonista, tentando captar a energia.

Mas no pagode budista fiquei um pouco decepcionada. Não sei nada sobre o budismo, mas esperava que ele fosse um pouco mais centrado na razão, no poder da mente, sabe? Essa coisa de rezar, de falar com seres superiores, de fazer oferendas, não cola muito comigo. Eu não acredito em deus, oras. Mas por alguma razão esperava entrar la e me maravilhar de alguma forma. Pensar "isso é exatamente o que eu estava procurando! Agora sei o sentido da vida e serei uma pessoa mais equilibrada e serena". E então começaria a comer orgânicos e me tornaria vegetariana.

Pode parecer doidera, mas a unica época da minha vida que eu me senti fazendo realmente parte de uma religião foi a época que eu ia em raves. Eu me sentia tão livre no meio daquela natureza toda, com todas aquelas pessoas que eu amava, com aquele mantra que saia das caixas de som e aquela energia boa, que eu lembro de ter pensado sinceramente que aquele sim era o real sentido da vida e que nada mais importava. Como era um ritual de todo fim de semana, com as mesmas pessoas, eu considerava minha igreja.

Mas não sinto a menor falta da religião na minha vida. Ela simplesmente não me faz falta. Eu so queria algo pra me ajudar a canalizar minha energia, mas de forma racional. Não quero ofender a religião de ninguém, mas achei engraçado ver aqueles parisienses brancos e ricos sentados de pernas cruzadas tentando entoar um mantra tibetano que eles não conseguiam sequer pronunciar. Acho otimo que a globalização dê mais opções de crenças às pessoas. Mas essa "escolha" de religião vai contra a minha logica pessoal. Explico: de um ponto de vista antropologico, as pessoas são religiosas porque nasceram numa cultura religiosa. Se te ensinam que Jesus morreu na cruz para salvar a humanidade, você tem fortes chances de acreditar nisso durante toda sua vida. Eh um caminho perfeitamente justificavel. Mas o que leva alguém a adotar uma religião com a qual nunca teve nenhum contato e assim, do nada, passar a acreditar que aquela sim, é A Verdade. Por que alguém se identifica com uma religião cuja lingua não entende e cujo estilo de vida não combina com seu? Sera que não é so um tantinho ridiculo pagar não sei quantos mil euros para fazer um retiro espiritual nas montanhas do Tibet?

Acho que mudar drasticamente de religião é a mesma coisa que se tornar ateu: você renega tudo o que foi te ensinado e parte pra outra. Por que então a primeira opção é muito mais socialmente aceita do que a segunda?

Eu invejo em parte aquelas pessoas que acreditam em tudo. Tipo a minha avo que tem umas quinze religiões (na duvida é melhor se garantir). Deve ser muito emocionante acreditar no que diz a cartomante, ou muito reconfortante acreditar que você tem uma vida boa porque nas outras vidas você fez o bem (e consequentemente culpar as vitimas pela sua propria desgraça), ou ainda muito encorajador ouvir o santo dizer que se você colocar uma galinha no cruzamento você conseguira o emprego dos seus sonhos.

Eu simplesmente não consigo. A ansiedade vai bem, obrigada.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O perfil do francês médio

A revista Le Point comemorou seu 2000° numero com uma reportagem especial sobre os franceses. São 50 paginas sobre o novo francês: quem ele é, como ele vive, quais são suas aspirações. Achei bem interessante, tem muitos dados e estatisticas, pena que tudo é comparado com outros paises da Europa e o Brasil nem é citado. Alias, se fosse uma pesquisa brasileira sobre os franceses com certeza a primeira pergunta seria "quantos banhos os franceses tomam por dia". Logico que esse dado nem aparece na reportagem, tamanho o absurdo da desconfiança.

Talvez eu faça outros posts sobre essa reportagem, mas nesse eu vou reproduzir o perfil do francês médio traçado pela revista, que eu achei bem criativo. Pois bem, o francês médio é... uma francesa. Ela se chama Nathalie Martin e tem 40 anos (52% da população da França é feminina. Na verdade nascem 105 meninos para 100 meninas, mas os meninos têm um risco de mortalidade maior, então aos 25 elas se tornam maioria). Nathalie Martin é o nome mais comum no pais e 40 anos é a média da idade de todos os franceses. Estatisticamente Nathalie vai morrer aos 72 anos. Nossa francesa mede 1,62m, pesa 62kg, calça 37. Se ela fosse homem mediria 1,76m, pesaria 77kg e calçaria 41.

Nathalie é catolica como 64% dos seus compatriotas, mas não vai à igreja. Apenas 4,5% dos catolicos vão à missa domingo. Ela se casou aos 29 anos e teve o primeiro filho um ano depois. O Estado gasta 8 mil euros por ano na educação de cada filho seu (ela tera 2 ou 3). Seu casamento tem 40% de chance de terminar em divorcio. Nathalie é assalariada, mas não ocupa um posto de chefia. As mulheres representam três quartos dos assalariados, mas apenas 9% delas são chefes. Ela estudou até o segundo grau, como 55% dos franceses de mais de 15 anos. Nossa francesa trabalha 35h por semana desde os 21 anos e ganha um salario de 1.405 euros, menos que seu equilavente homem. Mesmo assim ela economiza 16% do seu salario. Nathalie anda com 37 euros na carteira. Ela se aposentara em 2032 e tera ficado pouco mais de um ano desempregada em toda sua vida.

A cada ano, Nathalie produz 390kg de lixo e seu carro percorre 12 mil km. Ela vai 3 vezes ao ano ao cinema, assiste 1.138 horas de TV anuais e ouve 15 horas de radio por semana. Como uma boa francesa, Nathalie gosta de tecnologia: anualmente passa 28h falando no celular, envia mais de mil SMS e gasta 833 horas navegando na internet. Sua conta mensal de celular é de 38 euros. No seu Facebook ela conta 130 amigos, mas na vida real tem apenas 6 bons companheiros. Nossa francesa é heterosexual (apenas 4% da população declara ter tido relações sexuais com pessoas do mesmo sexo), transa 9 vezes por mês e teve sua primeira relação aos 17 anos. Nathalie tem 21% de chances de ser infiel no casamento.

A francesa média mora numa cidade com mais de dois mil habitantes, como 77% da população. Ela é proprietaria de uma casa de 91m² que deve ocupar durante 15 anos. Nathalie gasta 21 minutos para chegar no trabalho.

Voila! Essa é nossa francesa tipica. Suspeito que a Nathalie Martin é um tantinho diferente da Maria da Silva...

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

As linguas regionais da França

Sempre acho engraçado quando alguém me pergunta como se ja estou acostumada a viver numa outra cultura. Ja disse que eu nao acho que vivo numa "outra cultura". As diferenças com o Brasil sao minimas, afinal de contas nosso pais foi criado à imagem e semelhança da Europa. Mas tem coisas que a colonizaçao nao consegue (ou provavelmente nem quer) imitar. Enquanto nossa identidade cultural europeia foi abafando nossas raizes indigenas numa luta desigual, na Europa, os diferentes povos tentam sobreviver dentro da sociedade predominante. Por isso às vezes é dificil para nos, brasileiros acostumados com a centralizaçao e o senso pratico de uma naçao colonizada, imaginar que na França, esse pais tao desenvolvido, se fala outras linguas além do francês.


Sim, o francês é a unica oficial, mas as linguas regionais pertecem formalmente ao patrimônio da França desde 2008, graças a uma revisão na Constituição, bem tardia diga-se de passagem. Eh verdade que até bem pouco tempo, essas linguas eram consideradas inferiores, chamadas de patois (patoa) e as pessoas que falavam eram discriminadas. Puro preconceito. De algumas decadas pra ca, o orgulho de pertencer a um desses grupos e de falar a lingua de seus ancestrais foi aumentando. Mas infelizmente na mesma proporçao que a fluência desses dialetos foi diminuindo no cotidiano das pessoas.

Uma velhinha francesa me disse que o francês dominou todo o territorio nacional por causas das guerras mundiais. Como era muito dificil os soldados conseguirem se comunicar entre si cada um falando um dialeto diferente, eles foram obrigados a aprender o francês. Mas em casa, eles continuavam falando sua lingua. Também com a obrigatoriedade da educaçao formal, as crianças começaram a ser alfabetizadas em francês, mas em casa ele nem passava perto. A familia do cheri, por exemplo, vem do sul da França. Sua bisavo falava occitan como primeira lingua, mas ja entendia francês. Sua avo ja fez a transiçao do francês como primeira lingua, mas ainda falava occitan. Sua mae ja nao aprendeu occitan. Aos poucos as linguas dominadas foram perdendo a força, mas hoje em dia elas ainda sao faladas, por velhinhos em sua maioria, dependendo da regiao e da familia. Os jovens até têm interesse em aprender, mas quem tem tempo hoje em dia? E convenhamos, se for pra aprender outra lingua, o inglês ou espanhol têm muito mais utilidade. O mapa abaixo mostra onde o occitan ainda é utilizado.


Treze linguas regionais sao ensinadas nas escolas publicas francesas, contando com os territorios ultra-mar (Tahiti, Nova Caledônia, etc). Contando so a regiao metropolitana da França, que é como eles chamam o hexagono francês na Europa, elas somam oito: basque, breton, catalan, occitan, corse, gallo, francique e alsacien

Inutil dizer que esse fenômeno acontece em toda a Europa. Achei um mapa legalzinho que separa o continente de acordo com as linguas faladas e com seus povos historicos (mas nao sei se é certo falar de "povos" nesse caso - me falta uma palavra melhor).

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Canções de ninar ou como traumatizar seu filho com musica francesa, parte 2

Continuando a série de musiquinhas infantis bizarras, apresento Malbrough s'en va-t-en guerre. Essa canção fez grande sucesso no século 19 e ainda hoje é cantada pelas criancinhas. A primeira vez que a ouvi não acreditei! Clipezinho simpatico ai embaixo e minha tradução mal feita logo depois.



Malbrough vai à guerra
Mironton mironton mirontaine
Malbrough vai à guerra
Não sabe quando volta

Ele voltara na Pascoa 
Mironton mironton mirontaine
Ele voltara na Pascoa
Ou na Trindade

A Trindade passa
Mironton mironton mirontaine
A Trindade passa
Malbrough não volta
 
A senhora sobre em sua torre
O mais alto que ela pode

Ela vê um pajem chegar
Todo vestido de preto

Pajem, meu belo pajem
Que noticias você traz?

As noticias que trago
Seus belos olhos vão chorar

Deixe suas roupas rosas
E seus cetins bordados

Senhor Malbrough esta morto
Esta morto e enterrado

Eu o vi sendo carregado
Por quatro oficiais
Um levava sua couraça
Um levava seu sabre (espada)
O outro seu escudo

Vimos sua alma voar
Através dos louros
(...)

Tem uma outra musica muito famosa aqui na França, a Jean Petit qui danse, que é super fofinha, letra simples, bem util pra ensinar as partes do corpo para os pequenos, como a Alouette do post passado. O Jean dança com o pé, com a mão, com os dedinhos, com os braços, com a cabeça, nada de chocante. Clipezinho abaixo:


Dai descobri a origem da musica. Pobre Jean Petit. Na verdade, ele foi um cara torturado em praça publica no século 17: teve todos os seus ossos quebrados um a um. E cada pedaço do corpo cantado na musica na verdade é um osso que foi quebrado. Quer dança mais macabra? Teve um grupo occitan (povo do sul da França com lingua propria) que fez uma homenagem a Jean Petit, uma espécie de réquiem em sua memoria. A musica esta ai embaixo, com a letra em occitan (percebam que é uma mistura de francês com português e um toque de latim).

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Canções de ninar ou como traumatizar seu filho com musica francesa - parte 1

Eu não acho que todas as tradições são boas, muito pelo contrario. Acho que algumas delas deveriam desaparecer para sempre. As coisas mudam, evoluem e o que fazia sentido no passado não tem mais seu lugar no presente. Um grande exemplo aqui. Mesmo os hinos nacionais eu acho uma ode ao anacronismo. Sou a favor de mudar tudo, reescrever as letras, tirar as passagens barbaras. Ou melhor, sou a favor da extinção dos hinos nacionais: pra que servem, afinal? Pra cantar nos eventos esportivos, deve ser.

Pois algumas canções infantis entram nessa categoria de tradição barbara que insistimos em passar pra frente. No Brasil nos chocamos quando prestamos atenção nas letras que maltratam gatos; estimulam a violência fisica como forma de educação (não vou la, não vou la, não vou la, tenho medo de apanhar); põem medo com bois pretos e cucas e outras pérolas da sabedoria popular brasileira. Dai dizem, ah, eu cresci com essas musicas e me tornei uma pessoa normal. Mas, pombas, por que temos que crescer com essas musicas? Que tal cantarmos outras? Ja ouvi dizer que essas musicas foram criadas por escravas que se vingavam dos patrões metendo medo em seus filhos. Mas acho que não é verdade, acho que era uma coisa da época mesmo, onde ameaças, tapas e medos faziam parte da realidade das crianças. Que bom que evoluimos, não? Então por que não trocar a trilha sonora também?

Pois na França as musicas infantis sinistras também continuam sendo passada de geração em geração. Uma pior do que a outra! Canibalismo, guerra, pena de morte, crueldade contra os animais, tortura. Algumas foram adaptadas, uns versos mais pesados cortados aqui e acola, mas continuam ai. Olha o que as criancinhas francesas andam cantando por ai:


*Essa playlist tem as três musicas abaixo

Alouette (cotovia, um passarinho)

Alouette, gentille alouette (passarinho, gentil passarinho)
Alouette, je te plumerai (passarinho, vou te depenar)

Je te plumerai le bec (vou te depenar o bico)
Et le bec, et le bec (e o bico, e o bico)
Alouette, alouette, ah ah ah ah!

Je te plumerai la tête (vou te depenar a cabeça)
Et la tête, et la tête (e a cabeça, e a cabeça)
Et le bec, et le bec (e o bico, e o bico)
Alouette, alouette, ah ah ah ah!
 
Je te plumerai le cou (vou te depenar o pescoço)
Et le cou, et le cou (e o pescoço, e o pescoço)
Et la tête, et la tête (e a cabeça, e a cabeça)
Et le bec, et le bec (e o bico, e o bico)
Alouette, alouette, ah ah ah ah!
 
Je te plumerai le dos (vou te depenar as costas)
Et le dos, et le dos (e as costas, e as costas)
Et le cou, et le cou (e o pescoço, e o pescoço)

Et la tête, et la tête (e a cabeça, e a cabeça)
Et le bec, et le bec (e o bico, e o bico)
Alouette, alouette, ah ah ah ah!

Je te plumerai les fesses (vou te depenar o rabo)
Et les fesses, et les fesses (e o rabo, e o rabo)
Et le dos, et le dos (e as costas, e as costas)
Et le cou, et le cou (e o pescoço, e o pescoço)
Et la tête, et la tête (e a cabeça, e a cabeça)
Et le bec, et le bec (e o bico, e o bico)
Alouette, alouette, ah ah ah ah!

Porque né, nada como sair por ai depenando gentis passarinhos....

Ne pleure pas Jeannette (não chore Jeannette)

Ne pleure pas Jeannette (não chore Jeannette)
Tra, lallallallalla lla llallalla lla lla
Ne pleure pas Jeannette (não chore Jeannette)
Nous te marierons, Nous te marierons (nos vamos te casar)
Avec le fils d'un prince (com o filho de um principe)
Tra, lallallallalla lla llallalla lla lla
Avec le fils d'un prince (com o filho de um principe)
Ou celui d'un baron, Ou celui d'un baron (ou com o filho de um barão)
 
Je ne veux pas d'un prince (eu não quero principe)
Tra, lallallallalla lla llallalla lla lla
Je ne veux pas d'un prince (eu não quero principe)
Encore moins d'un baron ! Encore moins d'un baron ! (menos ainda um barão!)
Je veux mon ami Pierre (quero meu amigo Pierre)
Tra, lallallallalla lla llallalla lla lla
Je veux mon ami Pierre (quero meu amigo Pierre)
Celui qui est en prison, Celui qui est en prison (aquele que esta na prisão)
 
Tu n'auras pas ton Pierre (você não vai ter teu Pierre)
Tra, lallallallalla lla llallalla lla lla
Tu n'auras pas ton Pierre (você não vai ter teu Pierre)
Nous le pendouillerons, Nous le pendouillerons (nos vamos enforca-lo)

Si vous pendouillez Pierre (se vocês enforcarem Pierre)
Tra, lallallallalla lla llallalla lla lla
Si vous pendouillez Pierre (se vocês enforcarem Pierre)
Pendouillez moi avec, Pendouillez moi avec (me enforquem também)

Et l'on pendouilla Pierre (e vamos enforcar Pierre)
Tra, lallallallalla lla llallalla lla lla
Et l'on pendouilla Pierre (e vamos enforcar Pierre)
Et la Jeannette avec, Et la Jeannette avec (e a Jannette com ele)

Matar um culpado é pouco, matar uma inocente é melhor!

Il était un petit navire (Era um pequeno navio)

Il était un petit navire (era um pequeno navio)

Il était un petit navire (era um pequeno navio)
Qui n'avait ja-ja-jamais navigué (que nunca tinha navigado)
Qui n'avait ja-ja-jamais navigué (que nunca tinha navigado)
Ohé, ohé...

Il entreprit un long voyage (ele começou uma longa viagem) 
Il entreprit un long voyage (ele começou uma longa viagem)
Sur la mer Mé-Mé-Méditérannée (no mar me-me-mediterrâneo)
Sur la mer Mé-Mé-Méditérannée (no mar me-me-mediterrâneo)
Ohé, ohé...

Au bout de cinq à six semaines (depois de cinco semanas)
Au bout de cinq à six semaines (depois de cinco semanas)
Les vivres vinr'-vinr'-vinrent à manquer (a comida acabou)
Les vivres vinr'-vinr'-vinrent à manquer (a comida acabou)
Ohé, ohé...

Ohé, ohé Matelot (oê, oê marinheiro)
Matelot navigue sur les flots (marinheiro navega sobre as ondas)
Ohé, ohé Matelot (oê, oê marinheiro)
Matelot navigue sur les flots (marinheiro navega sobre as ondas)

On tira à la courte paille (tiram no palitinho)
On tira à la courte paille (tiram no palitinho)
Pour savoir qui-qui-qui serait mangé (quem sera comido)
Pour savoir qui-qui-qui serait mangé (quem sera comido)
Ohé, ohé...

Le sort tomba sur le plus jeune (o acaso cai sobre o mais jovem)
Le sort tomba sur le plus jeune (o acaso cai sobre o mais jovem)
Ce sera lui-lui qui sera mangé (ele que vai ser comido)
Ce sera lui-lui qui sera mangé (ele que vai ser comido)
Ohé, ohé...

On cherche alors à quelle sauce (então escolhem o molho)
On cherche alors à quelle sauce (então escolhem o molho)
Le pauvr' enfant-fant-fant serait mangé (que a pobre criança sera comida)
Le pauvr' enfant-fant-fant serait mangé (que a pobre criança sera comida)
Ohé, ohé...

Il fit au ciel une prière (ele rezou ao céu)
Il fit au ciel une prière (ele rezou ao céu)
Interrogeant-geant-geant l'immensité (interrogando a imensidade)
Interrogeant-geant-geant l'immensité (interrogando a imensidade)
Ohé, ohé...

O sainte Vierge, ô ma patronne (oh santa virgem, oh minha patrona)
O sainte Vierge, ô ma patronne (oh santa virgem, oh minha patrona)
Qui a le cour cour cour afortuné (que tem o coração afortunado)
Qui a le cour cour cour afortuné (que tem o coração afortunado)
Ohé, ohé...

Au même instant un grand miracle (no mesmo instante um grande milagre)
Au même instant un grand miracle (no mesmo instante um grande milagre)
Pour l'enfant fut, fut, fut réalisé (para a criança foi realizado)
Pour l'enfant fut, fut, fut réalisé (para a criança foi realizado)
Ohé, ohé...

Des p'tits poissons dans le navire (pequenos peixes no navio)
Des p'tits poissons dans le navire (pequenos peixes no navio)
Sautèrent par par par plusieurs milliers (saltaram aos milhares)
Sautèrent par par par plusieurs milliers (saltaram aos milhares)
Ohé, ohé...

On les prit on les mit à frire (recolheram e fritaram)
On les prit on les mit à frire (recolheram e fritaram)
Et le p'tit mouss', mouss', mou-sse fut sauvé (e o aprendiz de marinheiro foi salvo)
Et le p'tit mouss', mouss', mou-sse fut sauvé (e o aprendiz de marinheiro foi salvo)
Ohé, ohé...

Pior do que ser devorado pelos seus companheiros, é ser salvo pela virgem.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Gente da Australia - Linda, Val e Jo

Três mocinhas elegantes: Linda, alemã; Valery, canadense de Québec; Jo, inglesa - inseparaveis. Primeiro conheci a Linda, a quem deixei minha vaga no apartamento de Brisbane quando fui embora pra fazenda. Dei um mole danado e esqueci de falar dos 300 dolares de caução que os novos moradores tinham que dar aos moradores que estão partindo, assim esses recuperavam seu dinheiro. Linda disse que não tinha grana e como eu estava prestes a ir embora, disse pra ela que quando ela tivesse, me dava. Duas semanas depois Linda anuncia aos moradores da casa na maior cara de pau: "Então pessoal, amanhã eu tô me mudando, vou pra fazenda também". E eles responderam: "Como assim, Linda? E quem vai entrar no teu lugar pra dividir o aluguel? Você tem que arranjar alguém!". "Tô sem tempo". E se não fosse minhas amigas rapidas no gatilho que encontraram alguém pra ontem com dinheiro da caução, eu teria perdido 300 dolares.

Assim Linda apareceu no mesmo albergue que eu estava e levou junto com ela Val e Jo. Não guardei rancor, pois naquela época nada era capaz de tirar meu bom humor. Então as três amigas passaram a fazer parte do meu cotidiano. Elas eram muito animadas, queriam se divertir e aproveitar sua estadia na Australia o maximo possivel, as doidinhas. Linda era a mais nova, ou pelo menos a mais deslumbrada com sua nova vida. Ela admirava suas duas amigas e fazia de tudo para ser igual à elas. Mas às vezes ela tinha comportamentos estranhos: ela me olhava sem parar e quando eu perguntava que foi ela ria e respondia algo como "nada, é seu cabelo que é engraçado" com diversas variações das partes do meu corpo.

Ja a Valery era a mais inteligente. Ela sempre vinha ensinar algo novo, contar uma historia interessante, conversar com todo mundo. Ela sabia fazer a festa, mas também ficava muito bem em ambientes mais sérios. Ela não levava desaforo pra casa e foi a unica pessoa que eu vi se defender da maior vilã da historia de Queensland (Jennifer, falarei dela outro dia, depois que me recuperar do meu trauma). Alguns meses depois encontrei com ela em outra cidade e sem suas duas amigas, ela era exatamente a mesma pessoa. Coisa rara, não?

A Jo era porra-louca total. Mas o engraçado é que nessas viagens a gente não sabe se a pessoa é assim mesmo na vida real ou se esta apenas aproveitando que esta longe de casa e dos julgamentos dos proximos para fazer o que der na telha. Um dia, depois do trabalho, estavamos so nos duas na fazenda esperando o dono do albergue passar pra buscar a gente (às vezes ele demorava 3h) e ela disse:

- Sabe, eu vim trabalhar aqui na fazenda pra poder dar mais valor ao meu dinheiro.
- Como assim? Você é rica?
- Eu trabalho como stripper aqui na Australia. Você não pode imaginar o tanto de dinheiro que eu ganho com isso. Em um dia de trabalho na boate eu ganho facil uma semana de colheita (e a gente ganhava bem). O problema é que o dinheiro vai subindo à cabeça e todas as meninas que trabalham com isso vão detonando a grana sem dar o menor valor. Elas compram maquiagem mais cara, bolsas de marca, roupas sem fim e depois jogam tudo fora. Tudo fica facil demais. Eu estava assim também, e morri de medo quando me dei conta, por isso decidi vir pra ca pra ter contato com pessoas de verdade.

Hoje ela deve ser uma advogada bem-sucedida em Londres.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Mestrado na França - FAQ

Pelo menos metade dos emails que recebo aqui do blog são de pessoas interessadas em fazer mestrado na França. Eu sempre respondo a todos, porque gosto de incentivar as pessoas a vir, dizer que vale a pena, que não é tão dificil quanto parece (não é dificil de entrar, sair ja é outra historia) e tal. Mas acaba que sempre tenho que escrever emails praticamente iguais com orientações sobre mestrado na França. Então decidi fazer esse tutorial sobre o assunto e deixa-lo com destaque na barra lateral do blog, assim, antes de enviar email, vocês podem procurar se sua duvida ja foi respondida aqui. E este sera um post modelavel, ou seja, cada vez que tiver novidades, eu volto aqui e acrescento mais informações. Como eu não sei tudo sobre o assunto, peço a ajuda de quem passou pelo processo para escrever esse FAQ. Deixem informações nos comentarios e eu subo pra ca.

Quero estudar na França, qual o primeiro passo?
Aconselho a investigar a possibilidade de você tirar um passaporte europeu. Não tem um avo português? Uma bisa italiana? Isso facilitaria muito sua vida, ja que todo o processo seria feito exatamente como se você fosse um cidadão francês, sem essa coisa chata de visto. Mas se não der, não tem problema, você so tera que ter um pouquinho mais de paciência com a famosa burocracia francesa.

Como escolher o curso ideal?
Pesquise pela internet. As universidades em Paris, por exemplo, vão de Paris 1 à Paris 13, então fica facil procurar no google. Mas é bom lembrar que as outras cidades da França têm universidades otimas, como Lyon, Toulouse, etc. Entre em cada uma delas e vai pesquisando os cursos que te interessam. Mande email para as secretarias perguntando sobre prazos, documentos, teste de francês, que eles sempre respondem e assim ja ficam sabendo do seu interesse (uma dica para emails: sempre comece com "bonjour Mme ou M tal" - de preferência não confunda os gêneros como eu ja fiz, os nomes daqui podem confundir - e termine com "bien cordialement, fulano de tal").

Eh dificil entrar?
Não. Entrar no mestrado na França é mais facil que entrar no Brasil, que tem varias provas e tal. Aqui o mestrado é simplesmente o que vem depois da licence (a faculdade em si) e se a pessoa tiver nota pra entrar, acho que 12 no sistema francês, provavelmente tem uma vaga no master. Tem uns cursos mais procurados que outros, é claro. Mas eu arriscaria dizer que para um brasileiro é até mais facil de conseguir uma vaga que um francês. Eles procuram sempre a diversidade, sabe, então esse é um ponto que temos a favor. Acho que para entrar num curso de master, precisa-se basicamente de duas coisas: falar francês e ter um bom dossiê de inscrição, incluido ai um otimo projeto de pesquisa.

Como funciona o visto de estudante?
Todo o processo deve ser feito pelo Campus France, mesmo se for intercâmbio com a universidade do Brasil. Para mais detalhes, olhar nos comentarios.
Morar na França é caro?
Sim, é caro. Mas se organizando bem, da pra viver tranquilamente. Depende muito da cidade que você escolher. Paris, por exemplo, tem os aluguéis mais caros do universo, mas em compensação tem mais oferta de emprego. Se você tiver um francês razoavel, não é dificil encontrar um trabalhinho pra pagar as despesas. Mas venha com uma boa reserva para os primeiros meses até você se instalar.

Bom, esse é o inicio. Se vocês tiverem mais perguntas, dicas, duvidas, etc, deixem aqui nos comentarios que a gente vai organizando um pequeno forum pra quem quiser fazer mestrado na França.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Dilma, Carla e a miss

E o ano de 2011 começa em grande estilo com Dilminha na presidência. Sim, vai ser duro, vai ter muita gente besta criticando o que não importa e quem sabe com um pouco de fé na oposição, até o que importa, como politica por exemplo. De qualquer forma, é um passo gigantesco na igualdade de gêneros no Brasil. Como a Lola disse, não é porque temos uma mulher na presidência que a partir de agora todo o sexismo se evapora, mas pelo menos se discute. O meu medo é as mulheres de direita se deixarem levar pela antipatia que sentem pelo PT e acabarem adotando uma postura machista como forma de desafiar a esquerda. Espero que elas tenham consciência do quão contraproducente seria essa decisão.

Ja no primeiro dia tivemos a prova de como essa luta sera longa. Enquanto Dilma brilhava em simbolos e representações, o povo desviava o olhar para o obvio e a imprensa ja bradava satisfeita que uma mulher bonita havia roubado a cena da cerimônia de posse, fazendo questão de nos lembrar, caso tenhamos tido a audacia de esquecer por 5 minutos, que aparência e bom casamento é um papel que cai melhor à mulher do que a presidência de um pais. Porque se perguntarmos pro senso comum qual das duas entre Dilma e Marcela é mais poderosa, corremos o risco de ouvir o absurdo. 

Ouvi muitas comparações entre Marcela Temer e Carla Bruni. Ouvi gente desejando a morte de Dilma para ter uma primeira-dama jovem e bonita como a primeira-dama francesa. O que esse pessoal não sabe é que Carla Bruni é um produto de exportação, porque aqui na França ela so é motivo de piadas. Acho que nunca ouvi uma referência à Carla sem ironia no meio. Os franceses de esquerda se aproveitam do ridiculo obvio da situação para rir da cara do presidente e mesmo os franceses de direita se sentem desconfortaveis. Como eles são mais velhos, mais conservadores, mais Familia Tradição e Propriedade, não gostaram nenhum pouco de ver seu presidente, que deveria ser alguém sério e reservado, nas paginas das revistas de fofocas ao lado de uma modelo-atriz-cantora que ja posou nua. Jacques Chirac, tratava sua esposa de vous, caramba, e chega Sarkozy e chama sua modelinho de Carlita. Com certeza isso não agrada a direita. Não é à toa que o petit Nicolas tem a popularidade super baixa.

Mas o que todo mundo sabe é que Carlita tem la sua função. Se na França sua função é dar assunto pra programas humoristicos, no exterior sua função é agradar as massas, coisa que ela faz muitissimo bem com suas caras e bocas de princesa comportada. Mas o interessante é que esse teatrinho não funciona em todos os paises, apenas nos mais subdesenvolvidos, aqueles onde a função principal da mulher continua sendo a de enfeitar. Tudo bem que na Inglaterra eles adoram uma fofoquinha e uma primeira-dama como a Carla Bruni deve agradar os ingleses. Mas a mise-en-scene é feita mesmo com a gente, os bobos do sul. Até o WikiLeaks revelou telegramas que admitiam como o governo francês se utilizava muito bem da Carla Bruni em suas visitas ao Brasil. O governo brasileiro não se deixou influenciar, mas se dependesse da população, ja teriamos uns 50 Rafales entulhados na garagem.

E ai fica a brasileirada torcendo para ter uma primeira-dama bonitona como a Carla. O que é uma vergonha para os franceses seria motivo de orgulho para os brasileiros. Imagino o constrangimento dos franceses se além de modelo-cantora-atriz, a primeira dama tivesse 40 anos menos que seu marido. Acho que rolava até impeachment. Quando temos a chance de provar que estamos mais na frente do que os paises desenvolvidos na igualdade dos gêneros elegendo uma mulher ao cargo maximo, estragamos tudo no minuto seguinte falando da miss ali ao lado.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Férias digital não programada

Brasileiras e brasileiros, desculpem pelo sumiço. Decidi tirar uma folguinha do blog, sabe? Fim do ano, tanta coisa pra fazer, estava sem tempo e sem vontade de escrever. Morri de rir com o comentario da Borboleta que disse que "ja deu tempo de anotar a receita do quiche, você ja pode postar outra coisa".

Espero que todos tenham passado um excelente fim de ano. Tomara que tenham tido uma farta ceia de natal, ganho muitos presentes, feito suas listinhas de resoluções para 2011, tomado muito champagne e cerveja, comido muito chocolate. Da minha parte, passei um otimo natal e um ano novo promissor com a Luci e a Aline, em Lyon. Se virar o ano rindo até não poder mais é garantia de felicidade o ano todo, não temos o que nos preocupar até 2020. Obrigada meninas, esse foi um dos meus melhores Reveillons ever!

E o blog volta com sua programação normal. Feliz 2011 para todos!
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