terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Quiche Lorraine à la Amanda


Cozinhar nunca foi meu forte. Mas confesso que nesse ultimo ano andei pegando mais gosto pela coisa. Em parte porque estive mais presente na cozinha, ja que tinha mais tempo livre que o cheri, que é quem normalmente prepara as refeições, mas acho injusto quem chegar cansado do trabalho ter que cozinhar se o outro esta em casa. Parceria é a palavra-chave. Então me munia do livrinho de cozinha que ganhamos no natal passado dos nossos amigos queridos e tentava fazer coisinhas diferentes. Andei numa fase de tentar eliminar ao maximo coisas prontas, tipo molho de tomate, conservas, massas congeladas, mas o problema é que o paladar acostumou com tudo fresquinho e agora faço careta toda vez que precisamos recorrer aos industrializados, o que não é nada raro. Talvez quem não more na França não saiba, mas aqui tem tudo pronto. A verdade é que estou gostando de experimentar pôr a mão na massa e hoje publico no post algo que nunca pensei que fosse escrever: uma receita.

Que fique claro que eu sou iniciante, então nada de muito sofisticado. O lado bom é que se eu fui capaz de fazer, qualquer um é também, então podem se jogar sem medo. A receita escolhida foi a de quiche, tradicional prato francês.

Quiche Lorraine

Massa (pâte brisée):
* 125g de manteiga (nem vem com esse papo de margarina)
* 250g de farinha
* Sal à gosto

Recheio:
* 4 ovos
* 300ml de leite (para uma quiche mais "rica", usar creme de leite)
* 150g de presunto picado (o original leva bacon defumado, como não gosto, adaptei)
* Sal e pimenta à gosto

Começar pela massa. Picar a manteiga fria em cima da farinha e do sal e ir amassando com os dedos até obter uma farofa assim:


Acrescentar um pouco de agua, no maximo meio copo, misturar com uma faca (é importante não manusear muito a massa com a mão):


Forme uma bola com as mãos, enrole naquele plastico de cozinha e deixe pelo menos uma hora na geladeira, onde se conservara por até dois dias.


Abra a massa com um rolo (vale a pena investir um euro - foi o que eu paguei - e se livrar dos copos e garrafas que so atrapalham sua vida). Forre um tabuleiro médio ou varias forminhas individuais, fure o fundo com um garfo e deixe esperando na geladeira. Coloque o presunto no fundo da massa (se for bacon tem que fritar antes). Uma boa variação é colocar alho poro ja cozido também, fica uma delicia! Misture os ovos, o leite, o sal e a pimenta e jogue a mistura sobre o presunto. Deixe no forno por cerca de 40 minutos, até que doure em cima.

Oh céus! Minha tortinha veio com defeito! Desculpa ai, tava tão faminta que esqueci de tirar a foto antes de comer. Essa tortinha foi a sobra da grandona ai de baixo.

domingo, 12 de dezembro de 2010

A justiça policial e um ministro sem noção

Tenho impressão que a policia é a instituição mais corrompida da França. Não é à toa que é uma das profissões mais detestadas pelos franceses. Todo mundo sabe que existe bons e maus policiais, mas a ideia geral é que eles são brutos, arrogantes, violentos e se aproveitam da posição de superioridade em relação ao cidadão comum. Por aqui, ter um policial na familia esta longe de ser um orgulho para os parentes. Enfim, não é uma profissão respeitada e o senso comum tem uma péssima impressão dessa classe profissional. A policia francesa ja foi condenada pela Anistia Internacional por maus-tratos, racismo, uso excessivo da força e pela impunidade para os policiais infratores.

Dai que a justiça francesa resolveu mostrar um pouco de dignidade e condenou sete policiais por falsas acusações contra um homem. Em setembro, um policial foi ferido na perna, atropelado depois de uma perseguição. Ele e seus colegas fizeram um pacto verbal para acusar o homem que perseguiam, mas a verdade é que foi uma viatura policial que causou o acidente. O homem em questão foi acusado de tentativa de homicidio de um policial, crime passivel à perpetuidade. Ao longo do processo, contradições entre os envolvidos começaram a aparecer e eles acabaram confessando a farsa. Na ultima sexta-feira, foram condenados de seis meses à um ano de prisão. Três deles foram condenados ainda por violência policial durante o interrogatorio do suspeito, que teve que ficar sete dias em casa por causa das agressões sofridas. Como os policiais precisam ter ficha limpa para exercerem sua profissão, os sete serão expulsos da policia.

Até que enfim uma boa noticia, não? Justiça sendo feita, dando o exemplo para outros policiais e limpando a corrupção de dentro da policia. Mas parece que nem todo mundo pensa assim. Primeiro foi uma manifestação de cerca de 200 policiais contra a decisão da justiça, revoltados com a condenação. Depois foi o ministro do interior, Brice Hortefeux (famoso por suas posições reacionarias e racistas) que declarou que "nossa sociedade não deve confundir o alvo: é contra os delinquentes e os criminosos que temos que lutar". Sim, monsieur Hortefeux, que tal começarmos pelos policiais corruptos?

Achei que eu estava perdendo alguma coisa, que não estava entendendo a historia inteira, tamanho o absurdo de suas declarações. Como condenar a justiça por ter feito enfim seu trabalho? Acho que essa historia ainda vai dar o que falar, mas espero que a justiça siga firme. A policia finalmente esta se sentindo vulneravel face à justiça e uma reviravolta daria aos policiais a certeza absoluta que estão acima da lei. Ja esta mais do que na hora de acabar com a tirania policial na França.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O vizinho musico

No Rio eu morava num prédio pequeno, onde todo mundo se conhecia e onde moravam essencialmente velhos. Uma vez peguei elevador com um cara jovem que nunca tinha visto antes e imediatamente fui com a cara dele. Batemos papo rapidinho e ele disse que tinha acabado de se mudar. Muito simpatico, sorridente, sotaque nordestino arrastado - sabe quando a gente reconhece alguém "dos nossos"? Pois ele era dos meus. Não perdi tempo e chamei logo ele pra ir tomar um café la em casa. Cinco minutos depois estavamos no meu apartamento. Eu perguntei o que ele estava fazendo no Rio e ele respondeu que era musico e estava gravando um CD. Dai ele contou que no Recife fazia parte de um grupo, a Orchestra Santa Massa e... Meu queixo caiu.

Pausa para explicação. No meu primeiro semestre da faculdade era muito amiga de um menino que trabalhava (e trabalha ainda) na Globo. Estava na casa dele quando ele me mostrou um CD que achou no trabalho e disse que tinha certeza que eu ia amar aquele grupo, que era a minha cara. Foi amor à primeira escutada. Pedi pra levar pra fazer uma copia pra mim e ele respondeu que tudo bem, mas que eu tinha que devolver o mais rapido possivel porque não era dele. Não tenho o menor orgulho em dizer que o tal CD esta na minha estante em Paris. Não sou mais assim, gente, juro. Podem me emprestar as coisas sem medo, viu? Mals, Rico, quando voltar eu te devolvo, ta? Pois o tal CD era "Orchestra Santa Massa e DJ Dolores".


Apaixonei, mostrei pra todos os meus amigos e viciei todos eles. Não faziamos uma festinha que não tocasse Santa Massa. Nossos amigos DJs incorporaram ao seus repertorios e todo mundo perguntava que CD era aquele, pois no Rio eles não eram conhecidos, e a gente se apressava em apresentar o grupo. Viviamos muito satisfeitos com nossa trilha sonora.

Por isso, vocês não podem imaginar o tamanho do meu choque ao ouvir que meu novo vizinho fazia parte da minha banda preferida. Minha vontade era de gritar histericamente e chamar todos os meus amigos la pra casa, mas fingi que era uma pessoa equilibrada. Me apressei em pegar o tal do CD e peguntar "essa Santa Massa aqui???". Sim, era ele, o percussionista, que também ficou surpreso e feliz por sua vizinha ter seu CD até então não muito conhecido. Olha, foi uma época muito boa ter o Jam como vizinho e amigo. Passamos um bocado de tempo juntos, quando não tinha nada pra fazer ia ver se ele não estava em casa. Minha melhor amiga também morava no prédio nessa época (porque nossas mães são melhores amigas), então a gente fazia a festa, era muito bom.

Mas um ano depois, mais ou menos, eu fui pra Australia e quando voltei Jam ja tinha levantado voo. Sempre falava com ele e ouvia "estou gravando com fulana", "agora estou gravando com sicrano". Comecei a ver seu nome no jornal, seu rosto na TV, sua musica no radio. Mudei pra Paris e daqui acompanho sua evolução. Nos encontramos esse ano numa de suas viagens à trabalho e adorei poder dar um abraço bem apertado nesse vizinho!

Então pessoal do Rio, quem estiver a fim de ouvir musica boa, Jam da Silva toca no Rival amanhã.

(e nem vou contar a historia da amiga francesa que o Jam me apresentou e que eu roubei pra mim mas acabei perdendo o contato, e que eu encontrei por acaso em Paris, casada com esse chéri aqui, que eu ja conhecia sem saber desse 'detalhe'. Que alias, é o melhor amigo dessa querida aqui. Adoro esse mundo minisculo!).

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Into the Wild - Uma critica, mas não exatamente ao filme

Nunca soube explicar porque não gosto muito do filme Into the Wild. As pessoas chegam pra mim, empolgadas, dizendo o quanto a-mam! o filme, o quanto o cara é excepcional, o quanto elas admiram quem tem uma coragem dessas. E eu fico la, com cara de quem comeu e não gostou.

Acho o filme em si meio bobinho, meio ingênuo, meio pretensioso, enfim, nada demais. Mas alguma coisa me incomodava nele e eu não sabia o que era. Então me dei conta que não é o filme que me incomoda, mas a interpretação que algumas pessoas fazem dele, como se aquela fosse a unica saida possivel do sistema. Elas admitem que o protagonista toma decisões sabias e nobres, mas decisões que elas proprias não poderiam tomar, então se confortam com a ideia de não fazer nada pra mudar e continuar vivendo suas vidas insatisfeitas. Ora, você não precisa doar todas as suas economias nem queimar o resto do seu dinheiro para mudar de vida. Você não precisa sair por ai caçando javalis para deixar de ser consumista. Você não precisa ser tão radical assim para encontrar a verdadeira felicidade. Acho que esse filme acaba sendo um conforto do tipo "viu, eu não tenho coragem de fazer o mesmo, então o melhor que tenho a fazer é continuar aqui onde estou". Não é oito ou oitenta, sabe.

Parece a mesma desculpa que ouço de gente que quer fazer grandes viagens mas não pode porque não tem dinheiro. Poxa, eu viajei três meses no sul da América do Sul e gastei pouco mais de mil reais! E olha que Brasil, Chile e Argentina são os paises mais caros do continente. Não peguei avião, andei 150 horas de ônibus (contadas), acampei, troquei alimentação por trabalho, fiz cocô no mato, não comprei lembrancinha nenhuma, mas foi uma experiência incrivel que vou me lembrar pro resto da vida. Mochilão não precisa ser na Europa, sabe. E pode ser com os filhos também, viu?

Outro exemplo são pessoas incomodadas com o estilo de vida mais leve de outras. Elas fazem pressão, soltam ironias do tipo "e ai, não ta na hora de arranjar um emprego?" e se sentem aliviadas quando suas vitimas finalmente cedem e entram no sistema como cordeirinhos. O interessante é que notei que as pessoas que vi fazendo esse joguinho ja demonstraram vontade de mudar de vida, de largar tudo e tentar outra coisa. Parece que elas precisam ter certeza de que outro caminho não era/é possivel. Porque se elas, que queriam tanto levar uma vida diferente, cairam no sistema, é porque uma via alternativa era utopia. Ver alguém conseguir ter uma vida com a qual elas sonharam seria duro demais. Então sorriem de satisfação quando outra pobre alma é obrigada a arranjar um trabalho que detesta e ficar la até o resto de sua vida. Então elas suspiram aliviadas e soltam um conformado "é assim que as coisas são".

#spoiler:

E se alguém por acaso ousar conseguir sair do sistema, é melhor que ele morra no final do filme. Assim a gente pode dormir tranquilo.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

E se nos mostrassem o que não queremos ver?

Ontem à noite estava vendo um filme sobre a segunda guerra mundial e torci o nariz quando a câmera deu close em dois corpos mutilados jogados num canto. Eu sempre achei que mostrar cenas morbidas, de cadaveres dilacerados e tal era de extremo mal gosto e servia apenas para o prazer bizarro que certas pessoas têm de ver essas coisas. Tipo aquele video Faces da Morte, sabe? Que mostra gente morrendo na frente das câmeras. Sempre fugi dessas coisas e não entendo como ha publico para esse tipo de espetaculo. Eu sentia o mesmo em relação ao jornalismo. Trabalhei no jornal da TV Brasil (quando ainda era TVE) e parte do meu trabalho era olhar as imagens que recebiamos da Reuters. Ficava irritada com a quantidade de corpos em estado inimaginaveis, mesmo de crianças, que apareciam na minha frente. Achava que os jornalistas não deveriam nunca expôr essas imagens.

Mas...

Ha uns três anos li o livro do jornalista inglês Robert Fisk, A Grande Guerra pela Civilização. Para mim, Fisk é a referência sobre cobertura de guerra, o cara é brilhante. Ele trabalha no The Independent (que ja respeito pela sua posição independente), mora no Libano e cobriu diversos conflitos no Oriente Médio. Dai que ele defende a publicação de fotos e videos barbaros, com corpos dilacerados, com crianças mortas, com braços espalhados pelo chão. Justamente para mostrar que a guerra não se resume aos numeros, às estatisticas, às estratégias. Ele viu coisas tão terriveis que acha que se todos vissem o que ele viu, o mundo seria pacifista. A verdade é que ouvir "treze pessoas morreram e trinta ficaram feridas" entra por um ouvido e sai pelo outro, mas ver as treze pessoas mortas e as trinta feridas nos jogaria na cara a barbarie que esta acontecendo logo ali, enquanto estamos sentados confortavelmente em nossos sofas. Porque a guerra é muito diferente do que acontece nos filmes. Quando um cara é atingido, raramente acontece como na TV que a bala entra no peito, mancha um pouco a camisa e tchum, ele morre. A realidade é bem mais feia que isso e a guerra de verdade é inimaginavel pra mim ou pra você.

Quem sabe se formos confrontados com a realidade, não nos comovemos mais, não vemos mais claramente o absurdo da coisa e fazemos uma maior pressão para o fim dessas guerras. Se o Bush fosse obrigado a ver cada um dos corpos dos inocentes que ele matou, quem sabe ele não tomaria decisões mais sabias no Iraque? Porque é muito facil continuar quando se tira toda a humanidade do conflito, quando a morte de crianças se torna "efeito colateral", quando a dor se converte em estatisticas e quando o sofrimento se transforma em numeros.

Continuo dividida. Ao mesmo tempo que acho os argumentos dele muito validos, não gostaria de dar de cara com fotos chocantes cada vez que abrisse os jornais. Sera que precisamos mesmo de um estimulo visual para termos mais empatia com os povos que sofrem?

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Duas indicações culturais

Fico surpresa quantas pessoas entram no blog procurando por quadrinhos franceses. Parece que muita gente anda ligada nos BDs daqui, seja porque tem paixão por quadrinhos, seja porque quer aprender francês e essa é uma excelente forma de treinar. So tem um problema: recebo varios emails perguntando onde encontrar HQs francesas no Brasil e eu nunca sei responder. Mas o Lucas, um leitor fã de quadrinhos, me deu a dica da Livraria Francesa, que não tem quase nenhuma das minhas indicações, mas tem muitos outros. Quem souber de outros lugares que vendem HQs ou livros em francês no Brasil, por favor deixe aqui sua dica!

Outra indicação bacana veio da Helena. Ela descobriu um site que disponibiliza audio livros gratuitos em francês. Assim, quando estivermos no metrô, no ônibus, ou até dirigindo podemos nos dar ao luxo de ouvir os classicos, sem forçar ainda mais os olhos ja cansados de tanto computador o dia todo. Ta valendo também para aqueles que querem exercitar o francês. Eu vou começar pelo Le journal d'une femme de chambre, de Octave Mirbeau, que é o audo livro mais bem votado do site. Comecei a ouvir e achei a voz da mulher bem clara e ela ainda acrescenta sons externos de acordo com a narrativa. Parece uma boa ideia, se vocês aderirem, voltem para dar sua opinião.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

O casaco mais feio do mundo

Acho que ja reclamei do frio pra todo mundo, então vocês ja sabem que em Paris esta um frio do cão! Amanhã a previsão é maxima de -3° e estou deprimida demais pra falar a minima. Nesse contexto de catastrofe (ainda não entendi porque não decretam logo estado de calamidade publica) eu tive que sair da minha casinha confortavel e quente para, argh, ir trabalhar. Tenho um casaco preferido pra ficar em casa. Ele é fofo, confortavel, cheiroso, macio, quentinho e tão largo que às vezes, em caso de frio extremo como janela aberta pra circular o ar, eu dobro as pernas, enfio o casaco por cima delas e fico em bolinha até tudo voltar ao normal. Esse casaco seria perfeito para usar no dia a dia contra o frio a não ser por um motivo: ele é muito, mas muito feio.

Pra começar, digo que ele é meu, mas na verdade é do cheri, eu que me apossei. Então ele é grande demais pra mim. Depois que as cores são muito anos 80, sabe aqueles coloridões? Pois é. Agoram vejam o meu dilema: sair quentinha, mas muito desconjuntada ou passar um pouco de frio mas não destruir a retina dos passantes? Pois eu tenho saido com ele, mas debaixo do meu casacão longo que so tiro quando chego na casa das crianças que tomo conta. Mas nem quero falar da expressão de terror das mães quando vêem tamanha afronta à civilidade dentro de suas proprias casas.

Dai que hoje estava indo trabalhar, andando o mais rapido possivel por causa do frio. Mãos congelando porque não achei a outra luva, duas calças, casaquinho quente, estava xingando essa cidade fria e todos os seus habitantes, até que parei em frente a uma loja e vi um cenario de filme. A vitrine tinha varios quadros, desenhos, pinturas e dentro dela vi um cara lindo desenhando, concentrado no seu trabalho, rodeado de livros, pinceis, tintas, lapis e um labrador caramelo maravilhoso deitado na frente da mesa dele. O cara parecia tão feliz, tão realizado, um sorriso lindo, num ateliê que parecia tão quentinho e confortavel em contraste com a rua fria. Acho que vi até uma lareira. Parecia tudo tão irreal, sera que existe mesmo alguém feliz no trabalho, sera que não é mito? Sera mesmo que alguém pode trabalhar com seu cachorro? E fiquei ali parada admirando a cena por alguns minutos, agradecendo mentalmente o cara por não ser egoista e não ter se trancado num quarto com muros, até que o cachorro me viu, saiu correndo na minha direção e ficou chorando na porta. O dono me viu, sorriu, se levantou, abriu a porta e o cachorro me trouxe um ursinho de pelucia pra brincar com ele. Foi ai que vi seu casaco horrendo (ou medonho, como diz minha mãe), quase tão desengonçado quanto o meu. O cara, muito simpatico, me explicou que ali era um ateliê de arquitetura e eu respondi que seu cachorro era muito fofo e fui embora. Fiquei com a impressão que podia ser o inicio de uma historia de amor, mas com a protagonista errada, uma vez que eu ja encontrei o cheri da minha vida e não o troco por nada nesse mundo, nem por um labrador. Então meninas, quem quiser eu dou endereço, porque acho muito desperdicio um cenario daqueles sem nenhum friozinho na barriga. E nesse frio todo mundo merece ter alguém pra esquentar os pézinhos na hora de dormir, mesmo que seja pra terminar tudo no primeiro desabrochar de flores. Pelo menos pra isso o frio tem que servir! So não esqueça de vestir o casaco mais feio que tiver no seu armario.

sábado, 27 de novembro de 2010

O verdadeiro problema do Rio

Meu entusiasmo com uma possivel mudança no Rio diminuiu bastante. Tudo bem que nesse momento estamos todos precisando de um pouco de otimismo e esperança, mas acho que o caminho é muito mais longo do que a gente quer crer. Estou gostando de ver os cariocas unidos, apoiando a policia e certos de que dias melhores virão. Mas temos que assumir que mudanças reais estão ainda muito longe de acontecer. Porque, como sempre, o buraco é mais embaixo. A dura verdade é que o problema do Rio não é o trafico de drogas.

Podem prender todos os traficantes, podem acabar com trafico, podem até legalizar as drogas que a violência vai continuar. Esse é so um dos meios encontrados pelos bandidos para ganhar dinheiro. Se não tiver drogas tera assalto, sequestro, e sabe-se la o que mais. Nos ultimos anos temos ouvido muito dizer que a educação é a solução, que trabalhos sociais são indispensaveis, que escolinhas de esportes ajudam as crianças a se manterem longe de problemas. Eh verdade que todas essas coisas são indispensaveis, mas sozinhas elas não se sustentam. Parece que com esse discurso a classe média quer lavar as mãos de qualquer responsabilidade, ja que educação é papel do governo. Fico surpresa que se fale tão pouco na real raiz do problema: a desigualdade social.

Enquanto houver tamanha disparidade entre os salarios, havera violência. Fiz uma pequena pesquisa pra comprovar essa teoria e vou expor aqui alguns dados. Pra começar, acho que todos sabem que o Brasil é um dos paises mais desiguais do mundo. A brilhante ideia dos militares de aumentar o bolo pra depois dividir não deu certo e até hoje sofremos as consequências. Não deu certo simplesmente porque ninguém nunca quer dividir. Pra se ter uma idéia, os 10% mais ricos do Brasil ganham em média 51 vezes mais que os 10% mais pobres. Esse numero é pior que o Peru (30 vezes), o México (25 vezes), a China (21 vezes). Entre os paises desenvolvidos, a comparação chega a ser humilhante: EUA (16 vezes), Portugal (15 vezes), França (9 vezes), Japão (4,5). Esse grafico sobre desigualdade que tirei da Wikipedia também nos ajuda a ter uma ideia do absurdo:


A violência esta muito mais ligada à desigualdade social do que à pobreza sozinha. Pessoas extremamente pobres convivendo com pessoas extremamente ricas se revoltam, sobretudo porque não ha quase nenhuma possibilidade de mudar de classe social, por mais que o capitalismo te queira convencer do contrario. O grafico abaixo que eu fiz mostra como desigualdade social e violência caminham lado a lado:

Desigualdade e violência em 21 paises:

A linha azul representa o coeficiente de Gini, um calculo que mede a desigualdade; a linha vermelha mostra a taxa de homicidios por 100 habitantes; e a linha pontilhada verde representa a porcentagem da população abaixo da linha de pobreza de cada pais. Os numeros foram transformados em uma escala de 0 a 1 para facilitar a comparação de indices diferentes. Vemos claramente que a violência tem relação direta com a desigualdade social e que a pobreza interfere pouco. E podemos perceber também que mesmo se o Brasil diminuir pela metade seus homicidios, ainda assim estara muito longe da média entre os paises desenvolvidos.

Acabar com o trafico nas favelas tem que ser apenas o inicio de uma politica conjunta entre todas as esferas do poder e da sociedade. Parece que os responsaveis pela segurança publica estão fazendo um bom trabalho prendendo os bandidos, mas apenas isso não é suficiente. A repressão sozinha nunca foi a solução pra nada. Teria que entrar sim a educação, os projetos sociais, mas acima de tudo a sociedade tem que estar disposta a dividir o bolo. Chegou a hora. Não da pra querer paz sem abrir mão de alguns privilégios. Não é na base da porrada que o problema da violência vai acabar, é na base da justiça - ela é unica via duravel. Não adianta nada o exército, a marinha e a aeronautica invadirem as favelas, se os pobres continuam pobres. Outros marginais vão surgir, se não com o trafico de drogas, com outra coisa.

Dividir o bolo é dificil porque todo mundo se acha pobre, ja que todos se nivelam para cima, nunca para baixo, se comparando com aquele tio rico ou com o vizinho bem de vida. Mas nos, classe média, precisamos sair da bolha que vivemos e assumirmos que somos a elite do Brasil e que não adianta nada continuarmos nos comparando com milionarios se a maioria da população vive na miséria.

 E ai, você esta disposto a dividir seu pedaço?

Guerra no Rio

Quando decidi morar na França fiquei triste por deixar meus amigos e minha familia, é claro. Porém, fiquei duas vezes feliz: a primeira por chegar em um lugar novo e a segunda por sair do Rio. Acho que eu devo ser uma das poucas cariocas que diz não gostar de morar no Rio. Poxa, eu vivia com medo! Tinha medo de sair à noite e voltar de madrugada, tinha medo quando cruzava uma viatura de policia na linha vermelha, tinha medo de ir da minha casa na Tijuca para a casa da minha avo em Olaria, passando por varias favelas e ouvindo tiros pelo caminho. Acontece que o meu Rio não é Ipanema, Leblon, Gavea. O meu Rio é Olaria, Ramos, Penha, Complexo do Alemão e somente aos 17 anos, Tijuca.

E eu não tinha medo so por mim. Quando minha mãe ia sozinha pra casa da minha avo eu morria de preocupação até ela ligar pra dizer que tinha chegado. Eu também morria de medo pela minha familia por parte de mãe que mora numa rua de acesso ao morro do alemão e pela familia do meu pai que mora na Penha, cercada de favelas. Quando eu fui embora continuei preocupada, claro, mas era menos pontual, porque eu não sabia quando minha mãe estava indo pra minha avo ou quando o bicho estava pegando nos morros. Mas às vezes eu ligava pro meu pai e ouvia os tiros no telefone.

O mais impressionante é a normalidade com que a gente encara a violência. Isso ficou ainda mais claro depois que vim morar fora do pais. Para mim, era absolutamente normal ouvir barulho de tiro e rajadas de metralhadoras. O cheri me zoava cada vez que eu ouvia um barulho e dizia "Xiiii, é tiro". Uma vez, logo no inicio, quase me joguei no chão achando que tinha tiro bem perto da gente. Imaginem o ridiculo da cena! Mas para mim ja era reflexo de sobrevivência! No começo desconfiava de crianças negras que detectava com o canto do olho e quando olhava pra elas me sentia a pior das pessoas: via crianças como qualquer outra, de mochila indo pra escola. Mas é isso que nos, cariocas, fazemos: desconfiamos de crianças negras que cruzamos na rua! E ainda as chamamos de trombadinhas. Eh dificil admitir, é muito triste, mas é verdade.

Cheguei ao ponto de acreditar que o Rio era um caso perdido. Não tem mais solução, pensava. E todo mundo à minha volta também pensava o mesmo. Imaginem a minha surpresa e felicidade ao conversar com cariocas que diziam que a violência no Rio estava melhorando com a nova politica implantada pelo governador Sérgio Cabral, com suas UPPs. Minha mãe disse que o caminho para a casa da minha avo estava bem tranquilo, meus amigos do Grajau disseram que as favelas em voltas estavam numa paz que nunca tinham visto antes, mas uma coisa me preocupava: todo mundo dizia que os bandidos estavam sendo expulsos de suas comunidades e se concentrando no gigante Complexo do Alemão e o dia que a policia invadisse o Alemão a coisa ia ficar feia.

Achei normal a reação dos bandidos para tentar pôr a população em pânico para que ela fizesse pressão para acabar com essa politica que os esta prejudicando. Mas a população não é boba e pela primeira vez esta totalmente do lado da policia. Acho que a grande maioria dos cariocas é favor de ir até o fim, como se essa fosse uma batalha final de uma guerra que durou décadas. E eu pensei, poxa minha familia ja vive sob risco constante, então pelo menos dessa vez é por um bom motivo e quem sabe, pela ultima vez. Como estou longe não sei exatamente qual o clima do Rio nesse momento, mas meu amigo Flavio me deu uma ideia do otimismo geral:

"Eu realmente acho que alcançamos um divisor de águas. O clima na cidade é estranho demais. As pessoas estão com medo, mas o que se destaca mais é o engajamento da população, a coragem. Todos estão do lado da polícia, e finalmente conseguimos ver a polícia do nosso lado. Lá na Penha, as pessoas estavam dando água para os PMs!!! Onde já se viu isso no RJ!!! É a hora, e todos já sacaram isso. A sensação é de que não dá pra voltar atrás, agora é só ir pra frente. Mudou alguma coisa na cidade, não sei se pra melhor ou pior, mas alguma coisa mudou claramente.

Amanda, o Brasil é o país do futuro? A Tânia esteve aqui e disse que é o que mais se fala por aí. E eu acredito nisso, acho que em 4-5 anos essa cidade vai se transformar absurdamente. Limpeza, segurança, educação das pessoas, trânsito, Lagoa Rodrigo de Feitas, Baía de Guanabara... isso tudo vai mudar, seja por bem ou por mal. Seja profundamente ou só uma maquiagem para o mundo ver, mas essa cidade já começou o seu processo de mudança.

Nesses últimos dias de "atentados terroristas" e guerra declarada, Amanda, você tem que ver as declarações das pessoas nas ruas, ninguém se prende muito ao momento, todos falam da esperança no futuro. As pessoas estão muito conscientes de que precisam pagar por 20 e tantos anos de descaso com a segurança pública. Então estão falando assim mesmo: Temos que passar por isso, para isso acabar e chegarmos em um lugar melhor. O clima é muito diferente (acho que dá para notar pelo tom desse texto que escrevi, né?)".

Achei muito emocionante o que ele escreveu, mas não posso simplesmente gritar "agora é a hora, a policia tem que acabar com a festa dos bandidos", quando minha familia é refém dessa disputa. Eles estão la, presos dentro da casa que julgam mais segura, com medo. Minha priminha de um ano esta la. Quem foi trabalhar não conseguiu voltar e primos foram dormir na casa de amigos. Com certeza ter minha familia la no meio da guerra me faz ter uma postura diferente do que eu teria se eles não tivessem la. Provavelmente eu nem estaria tão interessada no assunto, estaria acompanhando meio de longe, entusiasmada com as mudanças que estão acontecendo e torcendo pra o exército invadir logo pra devolver a paz no Rio. Mas sera que para chegar à paz temos que passar pela guerra? Adorei a iniciativa da ONG Rio de Paz que propõe uma negociação de rendição dos bandidos, para que o alemão não se transforme em um campo de guerra. O pior é ler na internet mensagens de odio dizendo que não tem esse negocio de rendição, tem que invadir e matar todo mundo, jogar uma bomba de preferência!

Porque eu sei que é muito improvavel que aconteça algum dano fisico na minha familia se eles continuarem se escondendo, mas so esse terror, esse medo constante, ja é uma violência tremenda. Imagina dormir com medo de uma bala perdida invadir sua casa, imagina temer que bandidos te obriguem a escondê-los no meio da madrugada? Imagina ouvir barulho de tiros sem cessar? Helicopteros voando no seu telhado?

Estar longe não ajuda. Fico grudada nas informações, querendo saber de todos os detalhes. Quero muito que tudo isso termine de uma vez. Eu estou na França, mas o meu coração, mais do que nunca, esta no Rio.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Gente de Oz - Simon

Quando decidi largar a vida urbana australiana e rumar para o campo, uma amiga me indicou um backpacker (albergue em australianês) que te arranja emprego nas fazendas e te leva de van todos os dias pra trabalhar, em troca do pagamento da tua hospedagem. Esse esquema funciona muito bem por la e todo mundo sai ganhando: você, que não tem os contatos certos para arranjar emprego na agricultura e acaba conseguindo um trabalho e ainda transporte para esse trabalho, e o dono do backpacker que normalmente não teria nenhum hospede naquele fim de mundo, fica com sua espelunca lotada por causa de seus contatos com os fazendeiros.

Mas quando cheguei em Stanthorpe, uma cidadezinha trinta quilômetros depois das botas perdidas de Judas (onde conheci o cheri, hihihi) para trabalhar pela primeira vez nas fazendas, tive que ficar num hotel em vez do albergue porque estava lotado. Fiquei la uns três dias até abrir uma vaguinha no outro. No quarto do meu hotel tinha... uma cama. E so. Sem armario, sem espelhos, sem banheiro, sem mesa, sem televisão. Luxo total. E se no backpacker sempre tem gente pra conversar, rir, beber, naquele hotel so tinha uns velhos estranhos de pescoço queimado de sol e rosto vermelho de tanto beber. Na falta do que fazer eu ia ver TV na sala comum e foi assim que conheci o Simon.

Simon era um australiano de uns 30 anos, de olhos bem tristes. Ele falava e a gente sentia imediatamente a melancolia que emanava dele. Simon também estava trabalhando na colheita, mas como tinha carro proprio e era australiano, não precisava depender dos donos de albergues. A gente assistia filmes na TV e conversava e um dia ele resolveu me contar porque estava la. Disse que tinha uma noiva de quem gostava muito e um dia os dois tiveram uma briga feia por bobeira. Ele voltou pra casa e ela foi dar uma volta no mato pra espairecer. So que a menina acabou cruzando uma cobra, foi mordida e morreu naquele dia. Depois da briga. Ele disse que não podia acreditar, que se sentiu muito culpado e que não poderia continuar vivendo do mesmo jeito, como se nada tivesse acontecido. Então deixou a vida dele pra tras e foi viajar pela Australia: trabalhava quando dava, dormia onde podia, conversava com quem queria ouvir e assim ia tocando sua nova vida. Ja fazia dois anos depois da morte da noiva e ele ainda não tinha planos para o futuro.

Depois que me mudei para o backpacker continuei indo visita-lo quando dava e uma vez até levei o cheri. Ele era uma pessoa tranquila, que gostava de conversar, mas que a gente via que estava passando por um momento dificil. Acabamos perdendo o contato, mas sua historia nunca saiu da minha cabeça. Nem imagino seu sofrimento. Eu so posso torcer muito para que ele tenha conseguido refazer sua vida e superado esse triste trauma.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Poder sobre os desesperados: o sonho da elite conservadora que esta escorrendo pelas mãos

Ontem ouvi um dialogo na televisão francesa que me chocou profundamente. Uma mulher que trabalha numa agência de empregos estava falando como o sistema que liga as empresas aos desempregados precisa ser dinamizado. Ela explicava que às vezes era obrigada a exigir um processo longo e trabalhoso, geralmente bem longe da residência do desempregado, para um trabalho de apenas dois dias. Disse que a pessoa desiste, que não quer se colocar nessa situação de merda por causa de dois dias de trabalho. Ai um jornalista, Eric Zemmour, conhecido por suas posições racistas e conservadores, respondeu indignado: "Isso é um absurdo, isso é so porque eles têm allocation familiales (tipo um bolsa-familia francês, com a diferença que o montante é maior)". A moça disse que sinceramente, ela achava que nem se eles não tivessem, iriam. E o cara, do alto da sua arrogância, alegou que "Se eles estivessem passando fome, iriam" (s'ils crevaient de faim). 

O mais triste é pensar que se na França esse tipo de frase desumana merece destaque na televisão, no Brasil ela é senso-comum, passa completamente despercebida e aposto que tem muita gente que até agora não viu nada de chocante na afirmação do cara.Quantas pessoas ja não ouvi reclamando na internet do bolsa-familia, que agora ta dificil arranjar empregada porque ela prefere receber 100 euros do governo do que um salario de 300 pra trabalhar como escrava. O argumento é o mesmo do cara da TV: é melhor que eles estejam morrendo de fome mesmo, porque ai vão fazer qualquer coisa para a gente. Eh muito bom quando a pessoa ja não tem mais dignidade, esta desesperada, pois ela aceita trabalhar por comida e roupa velha. A gente da uns trocados e ela vira nossa escrava. O bolsa-familia devolveu o poder de decisão de gente tão humilhada, devolveu o respeito perdido, devolveu a dignidade.

Eh por isso que eu não admito que falem mal do bolsa-familia. E é por isso que eu tenho um grande problema em respeitar alguém de direita, porque simplesmente acho inadimissivel que discordem de um programa tão justo e humano. Podem me chamar de radical, de intolerante, mas a verdade é que eu quero distância de pessoas que vêm cheias de ironia e falam "E ai, ta feliz com a eleição? Agora vamos continuar sustentando os pobres". E falam isso sem tomar o menor conhecimento de causa, sem ter ideia que além de salvar a vida de muita gente, esse dinheiro movimenta a economia local, gera empregos, diminui a migração interna, diminui a violência e vai até mesmo evitar essa pessoa preconceituosa e alienada de ter seu celular de ultima geração roubado.

Eric Zemmour por acaso acha que se tiver gente passando fome na França todos vão se sacrificar para trabalhar dois dias num emprego de merda ou sera que alguns deles vão se revoltar com a situação e começar uma onda de violência? Porra, a coisa é tão simples que me da sono tentando explicar a essas pessoas que ajudar o proximo é ajudar a si mesmo. Vou mandar esse cara dar uma voltinha no pais dos sonhos dele, o Brasil (ainda!), pra ele ver qual o resultado da politica que gostaria de implantar.

domingo, 21 de novembro de 2010

Resultado da brincadeira

Pessoal, adorei vocês terem participado da minha brincadeira! Obrigada!! Ninguém acertou todas, mas também ninguém errou todas. Poxa, mas agora nem tem tenho vontade de dizer a verdade, ja que vocês acham que sou essa pessoa inteligente, corajosa, dotada de talento para a musica, hehehehe! Duas coisas me impressionaram: muita gente errou achando que eu era nerd e muita gente acertou que eu trabalhei de faxineira. Ok, sem mais delongas, ai vão as verdades e as mentiras:

Eu era a nerd da minha turma no segundo grau
Mentira. Passei longe disso: quase repeti de ano! Nem estudei pro vestibular e fiquei muito longe de passar em uma universidade publica. No ginasio (ainda existe ginasio?) eu era boa aluna, mas me dedicava muito mais à natação e minha matéria preferida era educação fisica.
 
Eu me formei em sapateado
Verdade. Essa é minha preferida pra chocar conhecidos. Ninguém que me conheça pessoalmente (e principalmente que tenha ido a uma boate ou a um samba comigo) acredita que eu tenha feito seis anos de sapateado e cinco de dança moderna. Danço feito um poste! O detalhe é que eu sempre detestei, mas por alguma razão eu dizia que queria continuar quando minha mãe perguntava a cada renovação de matricula. Devia ser masoquista.
 
Eu ja fiz fotos de propaganda quando criança
Verdade. Eu era uma criança bonita e ja dei uma de modelo uma vez ou outra. Mas os processos de seleção estavam atrapalhando meus treinos de natação e minha treinadora me fez escolher: "Você quer ser modelo ou nadadora?" e eu escolhi ser nadadora. Não tinha talento para modelo. Tampouco para nadadora.

Eu ja saltei de paraquedas
Mentira. Gente, estou superando meus limites fazendo escalada indoor! Paraquedas é im-pos-si-vel. Uma vez o dono do hotel em Ipanema que eu trabalhava me ofereceu um salto de paraquedas em Buzios, ele ia pagar tudo pra mim e eu recusei. Existe pessoa mais cagona que eu?

Eu fui eleita a segunda melhor flautista na minha escola de musica
Mentira. Não sei tocar nenhum instrumento e notas musicais são um mistério para mim. Mas sempre tive vontade de aprender. Agora me digam: porque diabos em vez de fazer sapateado, eu não fazia aula de violino? A sala era logo ao lado! Mas um dia ainda aprendo a tocar alguma coisa.

Eu ja sai de casa com a toalha enrolada na cabeça duas vezes
Mentira. Sinto decepciona-las, mas isso nunca aconteceu comigo. Hehehe! Por pouco, mas não aconteceu.
 
Eu namorei três anos um professor de educação fisica
Verdade. Meu primeiro namorado (na verdade quando começamos a namorar, ainda estavamos no segundo grau). Gostava muito dele, mas hoje não temos mais NADA A VER. E na época achava que iamos ficar juntos para sempre, aquela coisa toda. Que bom que ele terminou comigo, senão não teria feito um milésimo das coisas que fiz.

Eu ja raspei a cabeça
Verdade. Passei maquina 3 ou 4 no cabelo quando tinha 20 anos. Fui na casa do meu namorado da época (não é esse ai de cima) e pedi pra ele raspar. Foi uma libertação, recomendo.

Eu ja dei um soco na cara de alguém
Mentira. Acho que nunca briguei tão feio com alguém a ponto de querer dar um soco na cara.

Eu fiz plastica na orelha de abano
Mentira. Nunca tive as orelhas "descoladas", como se fala na França. E nem que tivesse faria uma cirurgia estética.

Eu nunca fiz dieta
Verdade. Sempre fui magra, quando criança detestava isso. Quer dizer, sempre fui magra até pouco tempo, porque ta rolando um ganho de peso no momento, culpa dos queijos franceses. Depois que escrevi essa lembrei que eu e o cheri dissemos uma vez que iamos fazer dieta, mas no fim das contas não fizemos nada, deu tudo errado, então acho que da pra dizer que nunca fiz dieta.

Eu ja trabalhei de faxineira
Verdade. Um dos piores trabalhos que ja fiz e olha que nem era pra limpar casas, mas escritorios. Foi na Australia, mas abandonei rapidinho, pois preferi ir trabalhar nas fazendas, onde o trabalho era mais pesado fisicamente, mas eu podia conversar com os outros e ninguém me olhava como um ser inferior.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Mostre-me teu blog, te direi quem és

A Rita fez um post otimo sobre a imagem que ela passa como blogueira, para os leitores. Ela diz que todo mundo pensa que ela é meiga, doce, centrada, enfim, um poço de sobriedade, mas que a realidade pode ser diferente. A Denise também falou sobre isso hoje, em como as pessoas a julgam por nunca reclamar de nada no blog, de so falar das coisas boas da vida dela, como se ela quisesse fazer acreditar que tudo é perfeito no seu mundinho. Não é porque não escrevemos sobre nossos problemas e dramas pessoais que eles não existem e como selecionamos o nosso lado que queremos mostrar ao outro, pode ser que passemos uma impressão completamente equivocada.

Pode ser que aquele blogueiro engraçadissimo demore 10 minutos para pensar em cada piada, o que faz dele na vida real, um ser não tão perspicaz assim. Pode ser que aquela blogueira que faz o maior drama em cada post use a internet como terapia e, ao contrario do que imaginamos, seja super animada na vida real. A Luci, por exemplo, me intimidava um pouco. Sempre tão descontraida, tão engraçada, tão cool, que eu achava que ela ia me atropelar contando todas as coisas interessantes que ela fazia na vida e ia acabar me achando monotona demais para ser amiga dela. Claro que estou exagerando e ja sabia que ela era legal, mas foi um reconforto conversar com ela 5 min e ver que ela superava todas as minhas expectativas. Pra quem lê seu blog e não a conhece pessoalmente, posso garantir que além daquela irreverência toda, a Luci também tem o lado doce da Rita, sabe ouvir, tem um sotaque delicioso, é uma pessoa simples e continua engraçada, logico.

Fiquei pensando qual a impressão que passo pra vocês. A Carol ja me disse que eu sou mais figura de verdade do que pareço no blog (não sei o que ela quis dizer, mas encarei como elogio, hihihi). Sera que passo uma imagem séria demais falando de Sarkozy, de politica, de nacionalismo, de feminismo? Gente, eu falo muita besteira, viu? No inicio posso parecer meio timida, meio sem jeito, mas depois que vou pegando intimidade, pronto.

Então inspirada no joguinho de "eu ja / eu nunca" que esta rolando por ai cujo o mérito é justamente chocar a impressão que as pessoas têm da gente, eu vou fazer um pouco diferente. Lanço 12 frases, 6 verdadeiras, 6 falsas, e gostaria que vocês tentassem adivinhar quais as verdadeiras.

Eu era a nerd da minha turma no segundo grau
Eu me formei em sapateado
Eu ja fiz fotos de propaganda quando criança
Eu ja saltei de paraquedas
Eu fui eleita a segunda melhor flautista na minha escola de musica
Eu ja sai de casa com a toalha enrolada na cabeça duas vezes
Eu namorei três anos um professor de educação fisica
Eu ja raspei a cabeça
Eu ja dei um soco na cara de alguém
Eu fiz plastica na orelha de abano
Eu nunca fiz dieta
Eu ja trabalhei de faxineira

Eh verdade que algumas coisas podem ser surpreendentes até para quem me conhece pessoalmente, mas é so uma brincadeira pra eu saber como vocês me vêem. :) Blogueiras, convido vocês a fazerem o mesmo!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Super Mamika

Quero apresentar pra vocês uma nova heroina: a Super Mamika!


Sacha Goldberger, é fotografo e teve a genial ideia de pedir pra sua avo posar pra ele. Parece que os dois se divertem muito se fantasiando e tirando fotos e Mamika morre de orgulho do netão querido. Todas as entrevistas que vi da super-heroina são hilarias, ela tem um bom-humor fantastico combinado com "não-ligo-para-o-que-os-outros-pensam". O resultado dessa brincadeira:













Super Mamika esta em exposição até dia 30 de novembro na galeria Wanted Paris.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Oz's people - Mariko

A Mariko é japonesa foi uma das primeiras pessoas que conheci quando cheguei na Australia. Ela fazia o mesmo curso de inglês que eu e apesar de estar em outra turma bem longe da minha era impossivel passar despercebida. Simplesmente todo mundo daquela escola sabia quem era a Mariko. Ela era muito expansiva, muito colorida, muito exagerada. A gente gostava muito uma da outra, mas tinhamos um probleminha basico: não conseguiamos nos comunicar. Não falavamos inglês direito e se para mim ja era frustrante não conseguir dizer o que eu queria, nem imagino como era para ela, que era uma tagarela de marca maior e tinha todas as coisas do mundo pra dizer, entaladas na garganta.

Até minha mãe a conheceu e disse pra ela que quando fosse ao Brasil era pra ficar la em casa. A Mariko ficou super feliz, deu gritinhos, bateu palmas e disse que minha mãe era sooo nice! Minha mãe não entendia uma palavra do que ela falava, mas morria de rir com seu jeito extravagante. Ficamos um mês juntas na escola, depois ela foi embora e um pouco depois, eu também. Mas alguns meses depois recebi um email dizendo que ela estava indo justamente para a cidade onde eu estava, Gold Coast, ja com o cheri a tiracolo. Ficamos super felizes de nos reencontrarmos, agora as duas com um inglês razoavel. Pudemos conversar melhor e na primeira oportunidade ela perguntou pra mim e pro cheri: "So, do you love each other?". Errrr, Mariko! Que saudade da época que ela não falava inglês! Ela nos convidou pra comer um okonomiyaki na casa dela, uma pizza japonesa. No meio do caminho quase foi atropelada e o cheri disse "Cuidado Mariko, senão oh, pah: japanese pizza no meio da rua!". Ela morreu de rir durante 15 minutos e depois me falou "Your boyfriend is sooo funny!". Pronto, cheri foi aprovado pela primeira vez por uma das minhas amigas.

Depois disso ela voltou pro Japão. Mas trabalhava durante uns dois meses, juntava dinheiro (sim, no Japão é possivel juntar dinheiro em dois meses) e viajava pra um pais diferente. Cada vez eu recebia fotos da Mariko nos lugares mais inimaginaveis do mundo! Dai que ela resolveu ir pra Guatemala, onde ficou por dois anos com um projeto lindo de educar meninas e mulheres no campo. Virou professora, mas aprendeu muita coisa também, entre elas o espanhol. Depois dessa longa estadia na Guatemala, ela viajou pela América Latina e passou pelo Brasil no caminho. Pena que eu não estava la. So não ficou na casa da minha mãe porque era carnaval e mami ia viajar. Mariko ficou na casa de uma amiga minha, mas elas mal se viram, pois a japinha tinha alguns amigos no Rio e elas acabavam se desencontrando mesmo dormindo na mesma casa.

Atualmente ela esta no Canada, mas parece que esta achando tudo calmo demais por la e quer voltar pra América Latina. Tenho certeza que qualquer dia desses a gente se esbarra por ai novamente. E dessa vez ninguém nos segura: estamos munidas de inglês e portunhol! O papo vai ser longo.

domingo, 14 de novembro de 2010

O mundo magico de Oz

Meus cinco leitores regulares ja sabem que passei um ano na Australia (2004/2005), onde encontrei o cheri. Morei em varias cidades, tive diversos empregos (principalmente na agricultura), mas sobretudo conheci muitas pessoas. Naquela época eu não tinha blog, alias nem sabia que eles existiam - olha que tonta, então sempre senti que tinha muitas historias pra contar, sem ter a oportunidade. Mesmo meus amigos sabem muito pouco do que eu vivi durante esse ano, pois na minha volta pro Rio a adaptação foi tão dificil (ok, ela nem aconteceu) que eu meio que me fechei durante os meses que morei no Brasil antes de vir pra França.

Eu tinha a impressão que eram mundos tão distantes que ninguém ia entender as coisas que eu queria contar. Acho que eu tive uma trip blues, pois minha vida no Rio ja não fazia mais sentido pra mim. Foi um periodo bem dificil e inesperado, ja que antes de ir pra Australia eu estava muito feliz no Rio e até achei uma pena ir embora em um momento tão legal. Mas muita coisa tinha mudado em mim. A Australia realmente mudou a minha vida: lembro de ter dito a alguns amigos na época "eu estou exatamente onde eu gostaria de estar e eu sou exatamente a pessoa que eu gostaria de ser". Tem felicidade maior?

Então quando voltei pra casa não consegui simplesmente pegar minha vida de volta e continuar do ponto em que havia parado. Tudo estava diferente e eu fiquei perdida. Briguei com amigos, fiquei timida no trabalho, não tinha vontade de sair de casa. Ainda tinha que decidir se casava ou separava, assim de uma hora pra outra por causa do visto do cheri. Foi um ano muito estressante e decepcionante, e acho que foi por causa disso que minhas memorias da Australia passaram completamente despercebidas. Mas elas continuam aqui e agora eu sinto vontade de dividi-las.

Hesitei em traze-las pra ca, pois na teoria o blog é para contar minhas experiências na França e a Australia não tem nada a ver com a historia. Mas não conseguiria manter um segundo blog e nem gostaria de criar um so pra falar sobre isso ja que pretendo escrever pouco, e como o Porte Dorée é acima de tudo um blog pessoal, mais do que um blog sobre a vida na França, decidir fazer aqui mesmo.

Em breve começo uma nova série: pessoas que conheci na Australia. :)

ps - pra quem não sabe, Oz é o diminutivo de Australia e sim, o Magico de Oz é australiano!

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Dia do armisticio e indicação de BD

Hoje é feriado de Armisticio na França, dia que marca o fim da primeira guerra mundial ou a Grande Guerra, como ficou conhecida na época (coitados, mal sabiam que ainda tinha mais vindo pela frente). Estar na França me deu mais consciência sobre as duas guerras mundiais, porque na escola quando eu as estudava parecia uma coisa muito distante, quase irreal. Acho que eu colocava a mitologia grega no mesmo patamar da historia mundial - acontecimentos tão surreais que eu não me identificava. Primeiro que tudo acontecia numa terra distante, que eu nem sonhava em pisar um dia. E depois porque o passado pra mim entrava tudo na mesma categoria: ido. Não importava muito se era na idade média ou ha 20 anos antes de eu nascer, era tudo velho. Não é à toa que eu sempre fui péssima para decorar datas historicas, errava facilmente de século e não tinha muita noção da sequencia dos acontecimentos (aqui jogo parcialmente a culpa nas escolas: como elas conseguem fazer um assunto interessante como historia ficar chato?).

Vir para a França me aproximou da historia mundial no tempo e no espaço. Eh so dar uma voltinha em qualquer bairro de Paris para rapidamente achar um monumento em homenagem aos herois das duas guerras mudiais. Em muitos prédios têm placas com inscrições do tipo "Homenagem à fulano de tal, morto pelas tropas nazistas em frente à esse prédio no dia tal". Eu sempre leio todas, fico pasma, olho em volta e penso como cada rua aqui tem historias pra contar. Eh estupido, eu sei, mas so me dei conta de como a segunda guerra mundial é recente ao ouvir pessoas me contando como era a vida sob a ocupação alemã. Tipo, aquela pessoa ali na minha frente viveu o nazismo! Ela é uma testemunha viva de uma das maiores catastrofes humanas! Poxa, a 2GM acabou apenas 10 anos antes dos meus pais nascerem! E o que são 10 anos? Nada! (acho que a gente so se da conta que 10 anos são nada quando fica um pouco mais velha, por isso não conseguia entender as coisas antes).

Hoje, infelizmente não existe mais nenhum soldado sobrevivente da 1GM na França. Quando cheguei ha 3 anos haviam apenas dois, mas morreram nesse tempo. O ultimo pediu que não fizessem nenhuma cerimonia especial, que ja estavam planejando, por respeito aos seus companheiros que morreram nas trincheiras e não tiveram a oportunidade de ter sequer um enterro. Essa guerra matou 13 milhões de pessoas, entre civis e militares. Eh muita gente. Eh muito triste.



Aproveito esse dia para indicar uma BD (historia em quadrinho) sobre a primeira guerra mundial- C'était la guerre des tranchées, de Jacques Tardi. Gostei muito porque não tem um personagem so, são varias historias de varios soldados, todas tragicas (o que não é tragico numa guerra?) uma mais tocante que a outra. A sorte - ou o azar - levou cada soldado pra uma situação diferente e eles fizeram seu melhor para sair dela da melhor forma possivel. Mérito para como o autor conseguiu passar a mensagem de que a guerra é uma guerra entre os grandes, que ficam atras de seus mapas tomando café, enquanto os pequenos se fodem no front. Soldados inimigos que em um contexto diferente poderiam ser melhores amigos. Gente simples que mata com remorso, sem saber porque esta matando, mas sentindo que tem alguma coisa de muito errada naquilo tudo.

O autor é filho de um militar e claramente pacifista. Ele critica a imbecilidade das guerras: "Apenas na França ha 930 hectares de cemitérios militares, boa terra pra beterraba, mas somente cruzes brotam à superficie! Se todos os mortos franceses desfilassem em filas de quatro no 14 de julho (comemoração da Revolução Francesa), seriam necessarios 6 dias e 5 noites antes do ultimo nos mostrar sua face livida".

Que tenham sempre flores frescas nos monumetos aos soldados.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Top 10 - As piores reformas Sarkozistas


Como disse o ex-primeiro ministro Dominique de Villepin ha dois dias: "Sarkozy representa hoje um dos principais problemas da França". Para quem estava querendo saber o que o presidente francês anda fazendo com seu pais, aqui vai uma pequena amostra do seu poder de destruição.
 

10- Expulsão dos ciganos
A França tem uma população de ciganos estimada entre 300 e 400 mil pessoas. Boa parte delas são originarias de paises da Europa oriental, como a România e a Bulgaria. Elas vivem em trailers e geralmente não ficam muito tempo no mesmo lugar, apesar de ter muitos ciganos instalados e levando uma vida mais ou menos como a nossa. O governo Sarkozy decidiu que os ciganos não eram mais bem-vindos na França e decidiu manda-los de volta aos seus paises de origem. Neste ano ja foram expulsos mais de 8 mil ciganos. O governo faz questão de divulgar os numeros de seu sucesso e alardear como estão conseguindo mandar de volta "de maneira voluntaria" os ciganos, mas faz papel de bobo, porque metade deles ja esta de volta na França. Criticado pela ONU, por outros paises europeus e por associações de direitos humanos, o governo francês esta respondendo a diversos processos por discriminação.

9- Lei Hadopi
Uma tentativa muito equivocada de punir a pirataria na internet. Trata-se de rastrear os downloads ilegais dos usuarios através do seu provedor. Na verdade a medida é super ultrapassada, ja que as pessoas entram na internet dos restaurantes, dos parques (a prefeitura oferece gratuitamente), dos vizinhos. Ja falei sobre a lei Hadopi aqui. Ela finalmente entrou em vigor, mas de pernas bambas e coração fraco. Os primeiros emails estão sendo enviados e junto com eles, vieram as primeiras reclamações de quem jura de pés juntos que não fez nenhum download ilegal. Uma das maiores operadoras do pais, a Freebox, se recusou a mandar as notificações, pois achou uma brecha na lei que lhe da o direito de preservar a privacidade dos seus clientes. A polêmica esta longe do fim.

8- Trabalho no domingo
No Brasil estamos acostumados com todo o comércio aberto no domingo, mas na França, a pausa dominical é algo muito importante, é um direito fundamental do funcionario. Ha um ano, a administração Sarkozy criou uma nova lei de trabalho aos domingos, favorecendo as empresas em detrimento dos funcionarios. Dependendo de sua localização, as empresas podem abrir domingo sem pagar nada a mais aos seus empregados. Na teoria, o trabalho dominical é voluntario, mas na pratica quem não aceita é mandado embora, por outros motivos, claro. Conheci uma funcionaria de loja de roupas que disse que antes da lei ela ja trabalhava aos domingos sem ganhar nada e que a medida so serviu para regularizar a pratica ilegal da loja. Ela continuou sem beneficios.

7- Aumento do poder policial
Como ministro do interior, Sarkozy ja vinha dando uma amostra de sua grande simpatia pela repressão policial, mas como presidente ele teve o poder de pôr suas ideias em pratica. Ja falei da violência policial aqui e disse que até a Anistia Internacional ja condenou as forças de ordem francesas. Sarkozy disse inumeras vezes que ele da todo seu apoio às forças policiais, que a prioridade do seu governo é a segurança nacional e que isso implica repressão, mesmo que seja contra estudantes protestando. Em 2008, o uso do taser foi permitido pelos agentes municipais e, entre indas e vindas atualmente é permitido, apesar dos sérios riscos alertados pelas organizações de saude e de direitos humanos.

6- Reforma das universidades
A Lei Pécresse (nome da ministra da educação francesa) quer transformar o sistema universitario do pais. Para quem não sabe, as universidades francesas hoje são gratuitas, acessiveis a todos e de qualidade. Temos que pagar apenas a inscrição, que custa menos de 500 euros com plano de saude, mas os bolsistas (que ja ganham em torno de 400 euros por mês) ficam isentos dessa taxa. A nova lei quer dar total autonomia para as universidades em 2012. Se hoje elas são financiadas igualmente pelo governo, no futuro elas poderão conseguir "patrocinios" de empresas interessadas na mão-de-obra que vai sair de la. Mas o que vai acontecer com os cursos da area de humanas, que não são tão rentaveis como os tecnologicos e biologicos? A qualidade vai cair, pois tera bem menos investimento. As universidades também terão, alias ja estão tendo, liberdade para selecionar quem entra e cobrar quanto quiser pela matricula. A universidade Paris-Dauphine vai aumentar sua taxa de inscrição de 231 euros para algo entre 1.500 e 4.000 euros. Em bom português: o governo esta privatizando as universidades. Sarkozy ja cansou de babar o ovo de Harvard, sim, aquela que custa 45 mil dolares por ano. 

5- Bouclier fiscal
O "escudo fiscal" foi criado pelo governo Sarkozy para diminuir os impostos pagos pelos ricos. A medida limita o imposto em até 50% da renda do contribuinte e esta custando aos cofres publicos cerca de 700 milhões de euros neste anos de 2010, mais de um bilhão e meio de reais. O principal argumento de quem é a favor do bouclier é o de que se uma pessoa ganha 100 por mês, nada mais justo garantir que ela receba pelo menos 50. Mas se o resto da população recebe 0,3? Não me parece nada justo. Ao mesmo tempo, o governo decidiu excluir uma lei fiscal que beneficiava os casais no primeiro ano de casamento. Como o bouclier fiscal beneficia apenas quem tem uma renda bastante elevada, na pratica a medida tira dos pobres e da pros ricos. O escândalo foi tão grande que o governo ja esta estudando sua supressão. As eleições de 2012 têm um papel importante nessa decisão, pois como Sarkozy anda muito impopular, a queda dessa reforma pode trazer alguns votos. Mesmo os leitores do jornal de direita Le Figaro, são a favor do fim da medida, como mostra uma enquete na qual 78% votou a favor da supressão.

4- Aposentadoria aos 62 anos
Quem tem algum contato com os franceses sabe que aposentadoria é algo sagrado pra eles. Trabalham a vida toda pra se aposentar, então imaginem o escândalo que foi o anuncio do aumento de dois anos na vida util de um funcionario. Muitas greves ja aconteceram. A oposição denuncia varios pontos criticos da nova lei, por exemplo, em como ela vai prejudicar as mulheres que escolheram trabalhar meio periodo para se dedicarem mais aos filhos. Mas provavelmente a maior preocupação seja o plano a longo prazo da reforma, ja que ela tem validade até 2018, ou seja, daqui a oito anos eles pretendem extender ainda mais a idade para se aposentar, especula-se em 67 anos. Eh realmente uma situação dificil para uma população que esta envelhecendo, mas a oposição alega que quando começaram a trabalhar havia um contrato moral de aposentadoria aos 60 anos, então não podem simplesmente modifica-lo.

3- Reforma da saude
Muita gente aposta que a proxima grande bomba do governo Sarkozy sera a reforma da seguridade social. Atualmente as mudanças ja acontecem, de forma timida, mas firmes. Na França, quando a pessoa vai ao médico, normalemente ela paga a consulta que custa 22 euros e mais tarde é reembolsada pelo governo. Antigamente o reembolso era quase integral, mas vem diminuindo a cada ano. Ha três anos fui ao médico e paguei 7 euros. Esse ano paguei 17, pois não tenho médico de familia. Os remédios também são reembolsados, mas muitos deles estão saindo da lista de reembolso e os que ficam, a porcentagem devolvida é cada vez menor. E apesar do preço da consulta estar estabelecido em 22 euros, cada vez mais os médicos estão aumentando a tarifa, o que é contra lei, mas totalmente negligenciado no atual governo.

2- Reforma dos professores
Na França a grande maioria das crianças frequentam a escola publica, que é considerada de excelente qualidade. Mas desde 2007 o governo decidiu suprimir radicalmente as vagas de professores e a politica adotada foi a de subistituir apenas a metade dos funcionarios aposentados. por ano Então foram suprimidas 8.700 vagas em 2007, 11.200 em 2008, 13.500 em 2009 e 16.000 en 2010. E ja foram anunciados novos cortes para o ano que vem. Além disso, o governo esta contratando cada vez menos professores especializados, como professores de inglês nativos, por exemplo. Agora é a professora de matematica ou historia que da aulas de linguas, muitas vezes sem sequer falar inglês. Como o numero de efetivos diminuiu muito, o tempo de treinamento diminuiu também e agora os professores saem do concurso direto para a sala de aula. Outro problema é que, adivinhem, faltam professores. Quando um fica doente, não tem substitutos. O governo Sarkozy ja sugeriu que para resolver esse problema, a solução seria colocar os estudantes de segundo grau para segurar as pontas.

1- Controle da imprensa
Não é exatamente uma lei ou reforma, mas talvez seja até mais importante que elas. Desde o inicio do mandato sarkozista ja aconteceram varios escândalos sobre a relação entre a midia e o presidente. Alguns leves, como o photoshop da barriga do presidente na praia para não fazer feio, outras mais sérias, como a demissão do apresentador do telejornal da TF1, porque falou mal do Petit Nicolas. O jornalista estava ha 21 anos no cargo e deveria deixa-lo apenas em 2012. Sarkozy ja demonstrou seu descontentamento contra o Canal Plus e recentemente o Petit Journal denunciou a constante vigilância que sofreu sua equipe em Deauville, cidade onde os chefes de Estado francês, russo e alemã estavam reunidos. A ong Reporteres Sem Fronteiras divulgou mês passado o ranking de liberdade de imprensa no mundo e a França aparece em 44° posição. Em 2002 ela estava em 11°. Segundo a lista, atualmente a França tem menos liberdade de imprensa quea Namibia, a Costa Rica e a Africa do Sul.

domingo, 7 de novembro de 2010

Paris x NY em simbolos

Um amigo indicou um site muito bacana comparando simbolos de Paris e NY. So não gostei de uma coisa: das legendas. Acho muito mais interessante colocar so as figuras e deixar a pessoa adivinhar sozinha do que se trata. Então aqui eu reproduzo algumas figuras sem legenda para vocês brincarem. Depois passem no site para ver as originais e outras que não estão aqui. Bom domingo!









 






quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Patriota ou nacionalista?

Quando postei o texto de ontem, confesso que fiquei com medo dos comentarios que viriam. Porque não é obvio defender os separatistas nesse momento em que racistas estão usando das mesmas armas para sustentar preconceitos. Mesmo em tempos normais defender separatistas não é muito bem visto. A Lola, por exemlo, sempre faz referências negativas a eles. Mas vocês foram otimas! Ninguém me cruxificou!

Eu pensei na razão pela qual uma fragmentação do Brasil não me incomoda e cheguei a uma conclusão simples: eu não amo o Brasil. Digo, a nação. Não sou uma patriota. Pode parecer contrasenso depois de toda a campanha pela Dilma que fiz, mas eu explico. Amo as pessoas e acho que a Dilma é a mulher certa pra cuidar delas. Eh dificil explicar a diferença entre as duas coisas, porque dizer que a Dilma é boa para o Brasil é quase a mesma coisa que dizer que a Dilma é boa para a população, ja que uma esta interligada à outra. Mas por exemplo, eu não dou a minima para a soberania brasileira. Se o Brasil decide entrar em guerra contra seus vizinhos para expandir seus territorios eu ia achar que era piada, tamanho o absurdo. Eu nunca aceitaria fazer parte de uma guerra, caso o RS pegasse em armas para fazer sua independência. Po, se o povo acha que viveria melhor assim, dou meu apoio.

Não sou patriota, acho que o patriotismo so atrapalha o desenvolvimento humano. Fico torcendo para que um dia todas as fronteiras acabem e vivamos num mundo sem muros, mas acho que ainda falta muito pra isso acontecer. A unica diferença entre o patriota e o nacionalista é que o primeiro é de esquerda e o segundo, de direita. Mas o pensamento é praticamente o mesmo. Lembro que na minha fase patriota, quando achava um absurdo as pessoas so comprarem bandeiras brasileiras na época da copa e não saber cantar o hino nacional de tras pra frente, comecei a ver nas ruas cartazes que diziam "Halloween é o cacete, viva a cultura nacional" e coisas desse tipo. Achei o maximo, finalmente alguém estava tomando iniciativa contra essa invasão estadunidense no nosso pais. Entrei no site e tive uma tremenda surpresa ao descobrir que era uma organização de extrema direita, com viés militar, inclusive. Fiquei besta e percebi como os extremos se encontram, como num circulo. O comunismo tem mais em comum com a extrema-direita do que gostaria de admitir. E foi assim que essa ideia de patriotismo foi saindo da minha cabeça.

Hoje eu acho engraçado como os brasileiros no exterior exibem suas bandeiras tupiniquins com o maior orgulho. Hoje eu também acho que os hinos nacionais deveriam ser extintos ou pelo menos atualizados -estão super ultrapassados falando de guerras, sangue e inimigos com palavras que ninguém entende. Quando acontece um acidente de avião, minha primeira preocupação não é saber quantos brasileiros estavam viajando, porque sinceramente, isso não é importante. A vida de um brasileiro pra mim não vale mais do que a vida de um senegalês ou de um americano. Estava lendo um quadrinho sobre a 1°GM (outro dia falo sobre ele) e tinha uma parte onde os alemães chegaram por uma estrada com mulheres e crianças belgas como escudo e os franceses receberam ordem de atirar mesmo assim, porque as mulheres e crianças não eram "dos nossos".

Eu não ligo para nacionalidades, naturalidades e essas coisas que não escolhemos ao nascer. Porém ligo para outras caracteristicas que a gente vai adquirindo ao longo da vida, que é o respeito pelo proximo, a educação, a gentileza, o interesse em fazer do nosso mundo um lugar melhor para se viver. Isso é importante. Todo mundo sabe que idiotas e gênios existem em todo lugar, mas todo mundo também insiste em generalizar, eu inclusive. Eh um exercicio diario que precisa de bastante esforço, mas que no fim das contas, vale a pena.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...