quinta-feira, 21 de abril de 2011

Pequenas reflexões sobre o feminismo

Quem acompanha o blog ha um tempinho sabe que eu sou assumidamente feminista. Sempre fui, desde criancinha, apesar de não saber um nome para o que eu sentia. E embora eu sempre tenha me sentido assim, cai muitas vezes nas armadilhas anti-feministas quando era mais nova: ja achei que feministas eram bigodudas mal-amadas, ja achei de verdade que era minha obrigação de mulher usar salto alto e fazer as unhas (o que so me deixava frustrada, porque eu detestava fazer essas coisas), ja soltei pérolas como "não sou feminista, sou feminina", so porque achei a frase um pequeno ato de rebeldia.

Impressionante como a sociedade me fez desviar tanto de um movimento que claramente sempre foi o meu. Quando você é adolescente, você quer apenas agradar todo mundo, ser aceita. E nada mais "cool" que renegar movimentos politicamente corretos, não é? Eh uma tatica muito eficaz, ridicularizar coisas importantes. So que ai uma coisa acontece: a gente cresce. A opinião do outro deixa de pesar tanto e então nos damos a chance de ser um pouquinho menos "cool" e mais espertos.

Hoje eu sou feminista. Faço meu trabalho de formiguinha como todas nos, mas não ouso ir além disso, no sentido de estudar teorias do feminismo e tal. Respeito muito todos que se dedicam a isso, mas não quero que o feminismo tome conta da minha vida. Eh uma luta muito ingrata e eu sofro muito com as injustiças. Acho que a igualdade é resultado de uma evolução muito lenta, feita ao longo de gerações, quase naturalmente. Sim, algumas brigas precisam ser compradas, especialmente no que diz respeito às leis, mas acho que as juizas, médicas e presidentas fazem tanto ou mais pelo feminismo mesmo sem levantar a bandeira, do que as feministas acadêmicas.

Acontece que apesar de feminista, eu não gosto do termo feminista e acho realmente que deveriamos encontrar outra palavra pra nos definir. Primeiro porque esta um pouco ultrapassado. Feminismo lembra o século passado, outras lutas, outro perfil. Sera que não ta na hora de se modernizar? Depois, porque o termo é passivel de erros - muita gente boa acha que feminismo é a versão feminina do machismo. Piadinhas sobre homens, homem-objeto, superioridade da mulher, HTP, comercial da Bom-Bril: tudo isso é feminismo para o senso-comum. E adivinha so: não é. Mas não é por maldade não, as pessoas simplesmente acumulam informações que a sociedade passa pra elas. So que, como a gente sabe, a sociedade é machista e não tem o menor interesse em esclarecer as coisas. Então temos ai um problema estratégico.

Sim, a gente tenta explicar pra todo mundo o que é feminismo. Gastamos um tempão lecionando nossos amigos que podemos ser feminista e largar o emprego pra tomar conta dos filhos; que podemos gostar de moda; que não odiamos os homens. Mas e ai? A maioria das pessoas simplesmente não liga. Não faz parte da realidade delas. Whatever. A maioria não tem o menor interesse em aprender o que é feminismo. Então não da pra ficar batendo na mesma tecla.

Eh natural que elas achem que feminismo e machismo são equivalentes, afinal de contas, as palavras são gramaticalmente equivalentes. E então nos nos desdobramos mais uma vez pra explicar todo o abismo que existe entre os dois termos. Colocamos o feminismo no pedestal e rebaixamos o machismo como o grande vilão da humanidade (e não é?). Mas ca pra nos, sera que não soa um tantinho arrogante tratar o termo feminino como positivo e o mesmo termo masculino como negativo? Não é o melhor exemplo de igualdade que gostariamos de passar. Tudo bem que existe milhares de casos assim na nossa lingua, sempre em desvantagem para as mulheres (aventureiro e aventureira, por exemplo), mas deveriamos dar um bom exemplo para não dar margem à contradições.

Quando eu estava lendo as criticas do livro Baise-moi na internet, descobri que tem também um filme (dizem que é um sick-movie, realmente perturbador) cuja diretora se define não como feminista, mas como antisexista. Fiquei pensando nesse termo por dias. Ele diz muito mais para o senso-comum que o feminismo e acho que nos define melhor atualmente. A nossa luta de agora não é mais pela antecipação feminina, isso ja aconteceu. Nossa luta é pela total igualdade. Lutamos agora tanto pelo direito de sairmos às ruas sem sermos importunadas, tanto quanto lutamos contra a pressão social sobre os meninos que diz que ele tem que importunar meninas na rua para ser homem. Lutamos pelo direito das meninas demostrarem agressividade tanto quanto lutamos pelo direito dos meninos se mostrarem sensiveis.

A verdade é que não lutamos mais apenas pelos direitos das mulheres, mas dos homens também. Então porque continuar insistindo em um termo que repele simpatizantes e não nos define mais como movimento?

15 comentários:

Vanessa Peres disse...

Ja ouviu falar de femismo? Não lembro se esse termo é o equivalente ao machismo ou se ele quer justamente se opor ao machismo. Dà uma procurada ;)

Vanessa Peres disse...

E se tentassemos "melhorar" a imagem do termo? Pq imagina, pra falar presidentA a gente é cabeluda e mal-baisée, imagina inventar uma outra palavra, explicar o porquê, tentar botar na cabeça do povo o significado, pra depois .............. puff, morri.

Aline Mariane disse...

por isso "sou pela causa das mulheres", assim como pela causa de todas as minorias oprimidas. Simples assim. Definitivamente, não gosto de me definir por nenhum "ista" porque lá vem os grupos e suas definições limitantes...

otimo texto, otimas reflexões!! =)
Bjss!

Rita disse...

Amanda, eu acho a crise inevitável, né. Pra mim, "Feminismo" traz a história das lutas das pioneiras, das que ousaram levantar a voz contra o machismo vigente em épocas em que as pessoas sequer paravam pra pensar nessas coisas. Então a carga histórica é boa. Eu acho que o trabalho de formiguinha que você faz é p*ta relevante e acho que algo parecido é feito para atrair outros simpatizantes para a causa e consertar distorções; quem se proclama feminista, acho eu, apesar do seu texto, tende a não ver problemas com o termo porque já entendeu que o buraco é mais embaixo, mas quem torce o nariz por causa dos estereótipos de "mulher mal amada" pode pensar duas vezes a partir do tal trabalho de formiguinha. Nunca pensei que o problema estivesse no termo em si, mas no que a sociedade faz dele - e que o movimento feminista vem se esforçando em evidenciar que, ei, não é assim, prestenção, feminismo não é o outro lado do machismo. Enfim, eu ando mais otimista em relação à aceitação do termo feminista porque muitos estereótipos estão sendo enfaticamente questionados e a luta hoje pesa muito mais para o lado de que podemos tudo com liberdade e respeito, inclusive ser feminista em várias formas distintas. A aceitação de que há feminismoS possíveis é boa, abre o leque e junta gente que nem sabia que queria o mundo que o antigo feminismo sempre quis. Não sei se sou muito otimista, mas tenho conhecido tanta gente antenada blogosfera afora que só posso ter boas expectativas. Acho que as próximas gerações de meninas e meninos terão no femismo um ponto de apoio muito mais confortável do que tiveram as musas mais antigas do movimento.

E quero levar seu texto pra lista de blogueiras feministas, pode?

Bj
Rita

Rita disse...

Oi, voltei.

Pra dizer que gosto do termo antisexista, apesar de gostar da carga histórica do feminismo. Enfim, pensando. Beijo grande.

Ah, e já linkei seu texto na lista. Pode, né? ;-)

Rita

Mari disse...

Também acho interessante o termo e o principio da luta antisexista, mas não acho que o termo feminista deve ser deixado de lado porque as pessoas tem problemas com o rotulo. Veja bem, as pessoas também tem problemas com o termo "trabalhador" porque dizem que ele se opõe à "patrão" e logo, à "empresario" e dae para "empresarios do mundo uni-vos" contra tudo que tem o termo trabalhador é um pulo. Se as pessoas não entendem que feminismo não é o equivalente feminino do machismo é porque são mal-informadas mesmo. E as mesmas são capazes de sair por ae dizendo que antisexista é aquele movimento que prega a abstinencia, pode escrever! Não acho interessante negar o peso historico do movimento feminista e de seu nome por causa da tacanhez daqueles que não se dão ao trabalho de pensar no assunto. Se eles não mudam, não se informam, não repensam seus principios, por que o movimento tem que fazer isso? Não precisamos nos "flexibilizar" para conseguir mais adeptos... os adeptos virão por que acreditam na causa e não porque o nome é mais atrativo. Par contre, acho sim que devemos pensar sim na questão do sexismo, que é ainda mais ampla.

Elaine Cris disse...

Muita gente tem uma ideia muito ruim e equivocada de feminimo por causa de uma verdadeira campanha que se faz contra mulheres feministas.
Não uma campanha orquestrada ou combinada, mas a medida que as feministas foram conseguindo certas coisas, quem era contra atacava com muita ofensa e muita ridicularização, desde os tempos das sugragistas já foi assim.

A consequência ruim é que acabou de certa forma "queimando o filme" da palavra. Muita gente é contra ou antipatiza com feminismo sem conhecer, apenas por causa do peso que os anti-feministas conseguiram dar pra palavra.

As vezes também penso se não seria uma boa estratégia mudar o nome, rs. Talvez seja mais eficaz que tentar reverter um conceito ruim que muita gente já formou sem mesmo conhecer bem.

José Fernando disse...

"Equalitárias". Eu e minha companheira participamos ativamente do I Encontro da Mulher Feminista de SP. Saímos de lá com a impressão de que algumas feministas tinham adquirido o que havia de pior no comportamento masculino, como o autoritarismo. E mais, algumas propugnavam uma "superioridade de gênero". Daí a gente pensou que era melhor ser "equalitário". Defender a total e irrestrita igualdade entre mulheres e homens. Para nós deu certo: ficamos 40 anos casados sem desequilíbrios nas responsabilidades. Criamos um casal de filhos sob essa égide e eles simplesmente agem como iguais, sem dramas.

Angela disse...

Ha muito nao me sinto confortavel usar o termo feminista aplicado a mim. De umas decadas para ca comecei a achar que estava me limitando. Sonho com igualdade, independente de sexo, cor, tamanho, raca, formas, situacao economica... Humanista?

Flávio Assum disse...

Realmente, Amanda, tem toda a razão. Eu nunca gostei do termo "feminista", sempre me senti alvo, mesmo que não sendo. Sempre me senti o causador da situação, mesmo que não sendo. Afinal, o termo "feminista" nos leva a uma primeira idéia de sexo e logo depois para uma idéia de divisão, que sempre busca o benefício de uma parte. É a lógica do termo, é a lógica da gramática, é a lógica da história, é a lógica do embate dos sexos.
Realmente, é um termo muito infeliz para traduzir isso que você fala em seu brilhante texto: o feminismo não é a luta dos direitos de um sexo, e sim, a luta dos direitos independente de sexo. Aí me sinto incluído. Aí é bacana demais!

Anônimo disse...

Amanda faz um tempo que te leio por Feed e hoje comento porque casa várias passagens do texto com as minhas batalhinhas diárias.

A palavra feminismo muito mais parece uma faca nas costas, ela limita pela carga esteríotipa rançosa que leva.
Achei engraçado aplicar o teste da Cynthia Semíramis em contra partida a perguntar diretamente "vc é fenimista?", quase sempre se nega o 2o tendo sido super positivo no 1o, há um desgaste do termo que influi negativamente.

Antisexista eu gosto, toca bem no ponto da idealização principesca, da padronização de comportamento, do sexismo que já as garotinhas são estimuladas a consumir, etc.
Talvez passe até a usá-lo dentro desse contexto.
Bj

Cris Chagas disse...

Adorei!
Tb gosto de antisexista.
bjs

Luciana Nepomuceno disse...

Eu gosto - muito - de antisexista. Mas, por agora, vou continuar feminista, rsrs, pois os argumentos da Rita aí em cima balançaram meu juízo. Ah, já falei que sou fã da sua inteligência? Ai que brabuleta repetitiva...

caso.me.esqueçam disse...

ah, sei la, eu nao me preocupo muito com a nomeacao da coisa. seja la como chamem a gente, sempre havera preconceito. parece um pecado querer igualdade. porque ninguem entendeu ainda que feminismo se trata disso. e tanta gente inteligente ainda confunde as coisas! parece ser o fim do mundo querer direitos iguais. e eh isso mesmo: a vida de uma feminista nao eh facil, e eh mesmo muito frustrante e cansativo fazer esse servico de tentar reverter as coisas. eu soh entendo que sou compreendida por feministas. porque ate as pessoas que concordam que devemos ter direitos iguais se mostram sempre sem saco pra entender o que nos falamos... nam... cansa.

caso.me.esqueçam disse...

eu soh ACHO que sou compreendida por feministas.

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