quarta-feira, 1 de julho de 2009

Proibição da burca na França

O governo francês quer implantar uma nova lei contra o uso das burcas na França. O presidente Sarkozy ja deu seu parecer favoravel (e ja foi devidamente ameaçado pela al- Qaida) e uma nova discursão se levanta por aqui: é legitimo decidir a roupa que as pessoas usam na rua?

Eu começo dizendo que essa pergunta por si so ja é falsa. Não é uma questão de roupas, é uma questão de mostrar o rosto ou não. A pergunta verdadeira seria: o governo tem direito de decidir se o rosto das mulheres deve ser escondido?

Eh bom lembrar que essa não é uma discursao religiosa, pois o Islã não cobra o uso da burca, é mais uma manifestação cultural, principalmente afegã, que se espalhou no ocidente como uma representação da religião muçulmana. Alias, aqui na França a maioria das muçulmanas não usa nem véu. Devemos nos perguntar por que então uso da burca no pais vem aumentando (segundo dizem as autoridades, pois eu pessoalmente nunca vi, e olha que estudo em Saint-Denis, cidade considerada como tendo o maior foco deles). Talvez seja uma reação ao preconceito contra o Islã, as pessoas querem se reafirmar e desafiar esse preconceito e encontraram no extremo sua resposta.

Até pouco tempo atras eu era completamente contra essa lei, mas agora ja não sei mais. Por mais que eu seja contra a burca, achava que proibir seu uso era uma porta aberta perigosa demais. Pensava que não era certo, em nome da liberdade, tirar a liberdade de escolha de quem quer usar a burca. Mas andei pensando e pesquisando e acho que existe um mito de que porque vivemos numa democracia, somos obrigados a aceitar todo e qualquer tipo de manifestação cultural, mesmo aqueles que abertamente são contra os principios da democracia. Ora, se fosse assim, teriamos que aceitar a poligamia também, ou o casamento forçado, ou o mutilamento feminino. Querendo provar que somos tão tolerantes, que aceitamos outras culturas, fazemos um retrocesso, principalmente nos direitos da mulher conquistados com tanta luta.

Do ponto de vista de uma democracia, nada mais democratico do que poder conversar com uma pessoa olhando nos olhos dela. Se ela vê seu rosto, porque você não pode ver o dela? Esse deve ser o principio mais basico da civilidade. O rosto é o minimo de sociabilidade de um espaco comum que é a rua, então vai sim, contra as normas de uma republica. Ver e não ser vista é voyeurismo.

Aceitar o uso do véu integral é matar o status da mulher. Eh tirar dela toda a humanidade. Acho que estamos todos de acordo com isso. O problema é se deve haver uma lei ou não. Do ponto de vista de um governo, acho sim que deveria ser ilegal, pois essa situação é uma quebra da democracia e dos principios basicos dos direitos da mulher. No entanto, é facil fazer uma lei e achar que isso vai resolver as coisas. Para o Estado, pode até ser que sim, pois não estaremos mais vendo o problema, mas e se o problema estiver trancafiado em casa?

Talvez uma lei seja uma solução preguiçosa para um problema muito mais profundo que envolve direitos civis e preconceito religioso. Mas alguma coisa precisa ser feita. O que?

15 comentários:

Patrick disse...

Eu vi um argumento interessante neste artigo. Vamos proibir as cirurgias plásticas de implante de silicone nos seios? Porque, tal como a burca, a maioria das mulheres que fazem essa cirurgia estão sob pressão da sociedade machista em que vivem. Não é ainda pior que a burca, por se constituir numa intervenção cirúrgica?

luci disse...

rah! juro pela minha mãezinha que eu queria te escutar falar sobre isso! juro pela segunda vez (eu juro bastante...) que conversei sobre isso com o dignissimo no sabado passado, assim, bem por cima, porque disse a ele que, pela primeira vez na vida, vi uma mulher cobrindo o rosto com o véu. quando vi, tomei um susto, gente com rosto coberto pra mim é assaltante (é, eu sou brasileira). então... como mulher, é mais facil dizer que essa pratica fere a dignidade feminina. mas tambem fere o direito de praticar sua propria cultura. é curioso, porque entao, se não elas não são obrigadas a usar a burca, elas cobrem o rosto porque elas gostam/querem. ou não é assim? então, se elas querem estar cobertas, por que proibi-las? acho que proibir as burcas nos predios publicos jah eh o suficiente, mas proibir na calçada da propria casa? não tenho uma opinião formada. gostaria de escutar não os franceses, não sarkozy ou a al-qaida, mas essas mulheres. o que sera que elas acham disso?

caso.me.esquecam disse...

*tem uma frase bastante confusa ai... hahaha

"é curioso, porque entao, se elas não são obrigadas a usar a burca..."

Unknown disse...

Elas são obrigadas a usar burca sim, nao por causa da religiao, mas por causa do machismo. Como a familia é patriarcal, o homem trata a mulher como objeto, quando mesntrua é pq deve usar burca, ja que nenhum homem deve vê-la. Alem disso, mutilação na genitalia, jamais será algo cultural, pois olhando a palavra "cultura" no dicionario, vemos que esse termo significa evolução da especie, e vejo a mutilação como um retrocesso. Sou a favor da lei sim. Alem do mais todos os mulçumanos sao preconceituosos e deveriam ser expulsos da europa. Imagina eles se tornando a maioria da população ja que casam cedo e odeiam metodos contraceptivos....
Sou a favor da lei sim.

luci disse...

ainda em tempo:

tava assistindo "paris, je t'aime" hoje e tinha uma muçulmana no filme que era questionada sobre o fato de usar o véu (não era uma burca, mas...) e ela disse que usava véu porque gostava, que não era obrigada, que ela encontrava a identidade dela naquilo, que se sentia bem. legal, mas... burca é foda. (eu não sei se a lei se refere so a burca ou qualquer tipo de véu).

ah, soh comentando sobre o que a asnalfa disse... discordo que cultura tenha a ver com evolução. e discordo ainda mais que os mulçumanos tenha que ser expulsos da europa. que coisa: um comentario preconceituoso sobre pessoas preconceituosas!

Maíra K. disse...

Ótimos argumentos, Amanda!

Pois é. Alguma coisa deve ser feita, mas eu ainda tenho as minhas dúvidas se é uma lei que vai resolver a questão. O Sarko disse que a questão da burca não é um problema religioso, é um problema de liberdade. Mas a "liberdade" que se dá às mulheres muçulmanas por um decreto não é legítima, não acaba com o machismo ao qual elas são submetidas, não vai na raiz do problema. Como você disse, parece uma solução preguiçosa.

Mas o debate é positivo. Vamos ver no que dá.

Unknown disse...

O uso da burca pelas muçulmanas na França é por livre vontade, algo mais usado como símbolo religioso do que ferramenta opressora, como ocorre no Afeganistão. É uma atitude espantosa, quando vinda da França. Mas ha um tempo atrás tentaram proibir o véu tb...

Amanda Lourenço disse...

Patrick, é isso mesmo! Gostei muito do texto que vc indicou. Eh muito ingênuo da nossa parte achar que so as muçulmanas são oprimidas. Eh impressionante como as pessoas não conseguem ver isso, pois estão tão dentro da propria cultura. Eu falo um pouco sobre isso aqui: http://portedoree.blogspot.com/2009/05/controversias.html
Mas, sabe, continuo achando que o rosto é o que temos de mais humano para oferecer ao outro, e tapa-lo é tirar a alma de uma pessoa.

Luci, não poderia deixar de falar sobre isso, né? So que não sabia ainda se so a favor ou contra a lei (e continuo sem saber). Pelo que tenho visto, algumas mulheres são obrigadas, e outras usam por opção. Mas como o asnalfa disse, se elas escolhem usar é por causa de uma vida de pressões. E a lei é so contra as burcas, se fosse contra o véu, esvaziaria a França!

Amanda Lourenço disse...

Asnalfa, expulsar os imigrantes? Então vc ta do lado do Sarko, é isso? Ta mais pra Le Pen, então. E não é verdade que todos os muçulmanos são preconceituosos, acho que todas as religiões são iguais: existe os radicais e existe todo o resto que não liga e acaba levando a culpa. Como disse, amaior parte dos muçulmanos da França não usa véu não vai a mesquita, come carne de porco, etc. Assim como os catolicos que não vão nunca à missa.

Obrigada Maira! Pois é, essa historia de lei ainda não deu muito pra engolir. Mas ao mesmo tempo que se fizerem uma, vai ter um lado negativo, se não fizerem tbm vai ter. Dai tem que ver o que vale mais a pena.

Marito, não tentaram proibir o véu não. O que eles fizeram, foi proibir qualquer simbolo religioso dentro de prédios publicos (escolas, hospitais, universidades, etc). E essa medida funciona até hoje. Um catolico não pode entrar com uma cruzinha no pescoço, nem uma muçulmana pode entrar com um véu, nem um judeu com a quipa. Principios de um Estado laico, dizem eles.

samya disse...

Oi Amanda tudo bem? olha eu sou a favor da lei sim, como voce ja viu la no meu blog, e te digo que para mim a nossa unica esperança mesmo eh a educaçao dessa nova geraçao, vai ser muito dificil tirar a burca de uma mulher de 60 anos que ja imigrou aqui com a burca como segunda pele, o que a difere da menina de 20 anos e francesa que usa a burca sera a educaçao e o espaço na sociedade que sera dado a ela. Eu tambem estudei na Paris 8, voce tem aulas com o jeanjean? E te digo que como ja morei tambem no 93 tive a oportunidade de ver muitas vezes mulheres velados dos pes a cabeça. Mas gostei muito do teu post tambem. UM abraço.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Antes de conseguir voltar a cursar jornalismo, fiz três semestres na São Judas, aqui de São Paulo. Hoje estou no Mackenzie e o curso é fora de série, muito bom mesmo. Ainda bem que tive a luz de não abonar nenhuma matéria das que cursei anteriormente, porque deixaria de aprender um monte de coisa. Mesmo curso, matérias com o mesmo nome, mas o conteúdo...
Pra vc ter ideia de como as notícias são passadas aqui, só falaram do véu naquela época. Tenho uma amiga que morou no Japão e os pais dela ainda estão lá. Quando estourou a crise no mundo, a Rede Globo noticiou que o governo japonês estava pagando uma quantia para que os imigrantes voltassem para casa...mas a verdade é que o governo estava dando incentivo para que os imigrantes ficassem, por representar uma fatia de peso no mercado consimidor e como provedores de mão de obra.

luci disse...

ah, amada, fudeu. eu ja tava pendendo pro lado de achar que era errado proibir as burcas. depois de ler o texto que teu amigo do primeiro post colocou, acho que sou contra (mas ainda deixo esse acho, porque mudar de ideia nunca eh errado, neh... hehehe).

do texto:

O caso de uma mulher homossexual que se veste de “maneira masculina” e não exibe o corpo adequado a uma mulher em nossa sociedade e por isso é assassinada uma certa noite em uma rua escura não se encaixaria perfeitamente nas descrições acima? Ora, nossa sociedade é tão radical e violenta no que diz respeito à normas de gênero quanto a Arábia Saudita, pensar o contrario é se iludir".

lindo!

luci disse...

*"amada" era pra ser amanda mesmo, mas pode deixar amada hahahaha

samya disse...

Asnalfa, quando voce fala de cultura,voce esta utilizando um conceito que voce desconhece. Etmologicamente a coisa eh muito mais abrangente do que voce poderia supor. A tua posiçao em relaçao aos muçulmanos é um direito teu, nao sei se voce teve alguma experiencia negativa mas acredita que seja vinculada ao fato de ter tido alguma experiencia desagradavel com algum muçulmano.
Mas tua generalizaçao e teu preconceito sao tristes e com o perdao da palavra completamente estupidos. Voce toca ai conceitos que desconhece. Voce sabia que que a mutilaçao feminina eh nao so presente em grupos humanos de religiao muçulmana? Que ainda hoje eh praticada por cristaos e animistas em muitos paises da Africa do Oeste? Voce sabia que a burca nao esta vinculada à menstruaçao? Voce sabia que o uso ou nao de anticoncepcionais tem uma carga cultural mais forte ainda que a religiosa? Voce sabia que a nossa sociedade ocidental, essa mesmo na qual voce vive eh patriarcal? Alias o patriarcado eh a base das sociedades todas no mediterraneo, e nos como frutos de uma colonizaçao vinda dessa regiao somos sim, patriarcais. Caso voce leie, tente um livrinho bem interessante de uma antropologoa francesa que se chama Germaine Tillon, o livrinho eh pequenininho, nao vai cansar nao, e se chama "Le harem et les cousins", infelismente nao conheço o titulo em português. Não, meu caro, voce nao disse absolutamente nada de interessante ou que posssam ter o minimo respaldo intelectual. Infelizmente.

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